As Verdes Áleas da Floresta Profunda
Recupere-se das áleas, o verdor das sombras densas,
que privastes em épocas de um amor vigil e romântico;
ou na tenra infância, em piculas tão alegres;
ou, quando ainda mancebo, o senso do imutável
cegava-te e na ofuscação tomavas-te de brios tolos
de mudar as coisas, o que querias por premio;
recupere-se, mesmo que num lapso da memória
agora não mais que alguns néscios pensamentos lidos,
já que da débâcle do ser humano, fez-se o fim da história;
vislumbre-se o brilho do eterno momento que cobiçaras
no verde róseo de uma floresta em chamas;
em acordes dos tempos, tão fugazes e já há tanto idos.
Se nada te encanta mais, se já não te fascina a arte,
articulação, artifício, humana fazedura;
se o prazer da acção criativa, não mais te captura,
não custa deixar-se à emanação de ritos pios;
não custa e extensão da retórica
e do sentido incurso em estar no mundo
exercendo a ação do possível;
Volta a aleivosia mais amiga, ainda que tocada
por ledos marcos rupestres, perdidos de tão antigos.
O hodierno sentir, não mais do que pesares;
os tempos ruins atuais, solidários sonhos carcomidos;
a derrotada esperança não invade mais aos lares
inquietos ou os de espírito brando.
Que o nada absoluto nos visite, nos aguarde,
já intuímos, quando os filhos se vão, mas
não sabemos onde se irão ter.
Melhor cingir-se a um viver no pretérito
que almejar um qualquer futuro inexprimível.
Só compreender que, como disse Heidegger
Já é tarde para os deuses, mas muito cedo
ainda, para o ser.
Ricardo S. Reis