Ficção: Sobre amores não vividos

Hoje pela manhã, ante ao velho bule de café e aos pães adormecidos de ontem, me dei conta da rotina que escolhemos para nossas vidas.

No nosso rastro, uma história perfeita de um amor perfeito, de um casal perfeito, ante a amigos perfeitos, e embalada por canções que transcenderam a perfeição.

Os abraços mais completos de nossas vidas foram os que doamos um para o outro. Talvez porque somente os abraços sejam palpáveis quando nossa história é contada.

Sim, palpáveis.

Pois como mensurar olhares que trocamos antes e depois de cada dia que vivemos?

Como precisar o exato instante em que aquela anestesia começava a fazer efeito?

Como lembrar em qual momento trocamos a magia desse olhar por um sorriso?

E depois desse sorriso?

Seria possível demonstrar isso com palavras?

Com gestos?

E como explicar a decisão de pausar esta história?

E como deixamos outras pessoas fazerem parte de nossas histórias?

E como pudemos viver tantas paixões tão intensas?

E como esse amor ainda sobreviveu a tudo e a todos?

Ao lavar a louça deparei-me com a imagem de nosso reencontro, que era ao mesmo tempo tão aguardado e tão improvável.

Foi como se tantos anos não houvessem passado, fazendo com que esta história seja contada a terceiros como uma obra de ficção.

Ficção.

Talvez seja esse o nome mais perfeito para definir um amor tão inacreditável, ou mesmo para traduzir duas almas tão pouco capazes de viver esse amor , ou talvez para explicar essa distância absurda entre nós dois.

Antes do fim da tarde, andando pelas ruas do centro, lembrei-me daquela canção que tanto gosto e que diz : “O que me separa de você agora? Um oceano, um avião e outros planos. E muitos enganos”...

Esta história de amor é uma ficção, como todo e qualquer amor não vivido.