A Origem e a originalidade - resenha (revisada e acrescida de comentário)

Dando continuidade à leitura de Michel Schneider, pretendo ser bastante suscinta no que diz respeito a um dos muitos temas da obra "Ladrões de palavras".

Para o autor, há uma dificuldade inerente à definicão mesma do que seja o plágio, já que a escritura em si é, ela mesma, MEDIAÇÃO, DESVIO, PRISMA. Para Schneider é necessário responder ao paradoxo do plágio e da originalidade, cotejando a sua dimensão não apenas literária ou da escritura "em si", mas também o que há de social e psicológico na questão. "Pensar "pelos" outros, escrever através de escritores precendentes, de certa forma é a trama da própria escritura, em que cada um é incessantemente despossuido de sua sua originalidade pela linhagem de que provém e pela linhagem que engendra" diz ele. As redes de filiações não são lineares: incluem anacronismos, cruzamentos, empréstimos mútuos, conformando um tecido, uma trama com certa espessura. "O empréstimo só faz "socorrer apropriadamente a invenção que vem sempre de mim", já que a própria escolha já é em si, uma interpretação e apropriação. Neste caso portanto, há um aspecto POSITIVO do que é "indiviso" na pesquisa ou no pensamento e que não procura desfazer o que é de um e o que é de outro. O que é "roubado" de uma obra, para Schneider, é o trabalho da obra, a idéia da obra, mais que a própria obra. Se a palavra "roubo" pode não ser a mais adequada, como podemos nomear ou qualificar o empréstimo do que é próprio? Da própria criatividade? Pergunta o autor. Abro aspas:

"É sobretudo do lado da impostura, da utilização fraudulenta de nomes, de títulos, de condecorações que seria preciso buscar: mais no registro da identidade usurpada do que na propriedade atingida. Se o plagio é admitido, é porque se confunde, para Schneider, origem e originalidade, sabendo-se contudo que a originalidade absoluta não existe. Esta, uma questão sempre ameaçada de vertigem entre o estranho e o próprio. E é nesse momento que a citação se rebate na criação."

A originalidade da obra decorre então, para o autor, está em sua capacidade de engendrar mundos psíquicos ou reais e não no fato de que uma visão "primeira" foi engendrada por um autor "primeiro" em sua origem, pois não haveria outra realidade a não ser a que o criador produz com o seu olhar (de sujeito daquilo que escreve ou diz).

São necessários ¨sofrimentos e mortes para que cresca a erva, não do esquecimento, mas da vida eterna, sobre a qual as gerações virão fazer alegremente seu dejeuner sur l'herbe", diz o autor. "O destino da arte e do artista se vê fortemente afirmado assim: o de "criar um mundo e logo desaparecer nessa criação a ponto de tomar-lhe ao mesmo tempo, seu nome proprio". Schneider se refere neste trecho à dimensão social do plágio:

"Não é tanto o fato de tomar emprestado tal ou tal fragmento a um escritor anterior, sem nomeá-lo, que torna o plágio insuportável, mas sim, a destituição da posse do ser que ele pressupõe. Antes de mais nada, é a potência do criador sobre suas criações que é emprestada, a glória que é fingida, a autoridade que é capturada com o pio". E daí nos remete a frase polêmica: "O plagiário se fixa menos em TER do que em SER"

Como comentário final desta resenha acrescento em sua revisão de 27/8: Schneider chega em um dado momento de sua obra a tratar de uma psicopatologia da escritura, a partir desta fixação em SER um outro que não se é.

Abraços a todos.