LINGUAGEM DIRETA EXCLUI A POESIA

Gessy, antiga em meu coração e querida poetamiga! Agradeço a tua permanente atenção e carinhos com que me agracias via Orkut. Tua comunicação me encanta, se bem que não gosto muito dos recados que são pré-formatados, imensos, ocupando página inteira, mesmo que texto e imagem sejam de bom gosto. Eles me cansam muito, usualmente são repetitivos... O que me agrada – mesmo – é o que estamos fazendo agora: trocando informações sobre criação literária, particularmente em Poesia, que é o tema que venho pesquisando com afinco há mais de trinta anos. E sinto que cada vez sei menos, visto que o universo do Mistério é inesgotável. A cada descoberta aparece um novo meandro, um novo escaninho... Não aprecio dar opinião pelo Orkut, porque não é esta a destinação do site, que se presta à trivialidade dos assuntos dos relacionamentos humanos, utilizando-se o ferramental da virtualidade. Peço sempre aos meus afetos e aos desconhecidos que chegam: publiquem os seus textos no Recanto das Letras, que é um sítio para escritores. Sendo que, na atualidade, contempla mais de 100.000 escribas, distribuídos em vários degraus da pirâmide estética e que açambarca os mais diversos e inusitados temários e assuntos. Bem, vamos ao teu texto. Entendo que não se trata de uma obra em Poesia, e, sim, parece-me um exemplar lavrado em Prosa, devido à utilização de linguagem direta, valendo-se apenas do sentido DENOTATIVO das palavras, e não do CONOTATIVO, que é o que caracteriza o texto poético. Este se consegue pelo uso da linguagem cifrada, assentada nas metáforas e outras figuras de linguagem. E, no texto ora em exame, NÃO HÁ UMA METÁFORA SEQUER. É um discurso de conteúdo moral bem posicionado, porém não contém Poesia, tecnicamente. Vejamos:

“VITRINE DA VIDA

Gessy Denardin da Silva Fioravante

Trabalho... mostruário...

Múltipla diversidade

Necessidade

Na vitrine da vida, confunde os jovens

Importante para o seu futuro

Mas, qual escolher?

Em tempos modernos

Tantos desempregados

Bendiga o seu, você que o tem.

Esforce-se para bem fazê-lo

Profissional dedicado, brilhante

Querê-lo... Mantê-lo...

Ser um vencedor!”.

É claro que se percebe que a autora pretendeu escrever no gênero Poesia, daí a linguagem monossilábica, vocábulos avaramente colocados, nítida economia de palavras, em que se pretende, com a utilização de 'reticências', induzir o leitor a pensar sobre significantes e significados. O óbvio que a primeira observação é a disposição do escrito em versos, ou seja, cada uma das linhas constitutivas de um poema. São chamados versos a unidade rítmica de um texto apresentado em Poesia. Acaso a autora optasse pela Prosa Poética a disposição dos vocábulos se daria em linhas cheias (frases), se estabelecendo a diferença entre a Prosa e a Poesia. Talvez o autor conseguisse o mesmo efeito emocional e intelectivo, mas uma e outra seriam formalmente distintas, mesmo que sejam exemplares típicos da criação artística. Em ambas deve haver a presença da linguagem figurada, principalmente metáforas e metonímias. E neste espécime, repito, elas não ocorrem. Sugiro que o texto em exame seja reescrito em frases, escrito de margem a margem, no melhor estilo prosaico. Escrito pertencente ao gênero Prosa, que poderia ser classificado com “Pensamento”, “Conselho” ou “Mensagem de auto-ajuda”, tão em moda nos últimos tempos. Textos neste sentido, no qual prevalece o conselho de raiz moral, são encontráveis desde a antiguidade, e, nos últimos tempos, aparecem na literatura alemã, forte em Goethe (séc. XVIII) e Brecht, no século XX. No entanto, se a autora quiser manter o texto tal como está, nada a objetar. Estará se manifestando em sua linguagem opcional sobre um assunto da atualidade, na ótica conservadora, forte na terceira estrofe, em que transparece o conformismo. Porém, me permito repetir: não se trata de uma obra em Poesia. Vale pelo mérito do discurso...

– Do livro A POESIA SEM SEGREDOS, 2009/12.

http://recantodasletras.uol.com.br/teorialiteraria/2206326