METÁFORAS UNIVALENTES

Agradecendo a visita em minha página e o comentário próprio, atendo ao convite para visita e análise crítica. Vamos ao texto:

“CONTRADIÇÕES

Conceição Bentes

Meu silêncio é ouvido

quando rasgo a inerte voz

quebrando em estilhaços mudos,

o grito que me impede

desnudar a alma e o coração

És meu cerco de contradições,

o relativo das circunstâncias,

o presente constante

de harmonia e devaneios

Tens a temporalidade

da indiferença cortante

tal gelo que dilacera a dor,

como armadilha iminente,

hipnotizando o som coloquial das palavras

Publicado no Recanto das Letras em 28/09/2009.

Código do texto: T1838071”.

A peça ora exposta está bem lavrada, tem estilo e profundidade de conteúdo. Não se trata do usual derramamento verbal que tão bem conhecemos. Há um mergulho individualista caracterizado pelo uso do possessivo "meu" e do pronome oblíquo "me". A possessividade da criação exclui o leitor, que não tem uma "janela" pra olhar pra dentro do conteúdo e, envolvido pela sugestão, vir a se apossar da peça como fosse dele, que é o que ocorre com o leitor de Poesia. O receptor crê que o autor está se dirigindo a ele, e, envolvido, vem a se encantar ou alumbrar-se. A rigor, trata-se de uma peça que contém expressivos adjetivos e verbos bem postos. Porém há rarefeitas metáforas univalentes, superficiais, inexistindo metáforas profundas, o que, tecnicamente, exclui a Poesia como gênero. São as metáforas verticais ou em profundidade, que – segundo Massaud Moisés e outros teóricos – vêm a caracterizar o texto poético. A autora perdeu a possibilidade de metaforizar, ao optar pelo comparativo em vez da metáfora, com o uso do "tal", no 3º verso da estrofe final. A supressão do "tal" e do "como" (4º verso, no final) permitiria o enriquecimento do texto com a utilização do sentido conotativo, e não do inexpressivo sentido denotativo, que sinaliza para o gênero Prosa, tal como está apresentado. Parece-me que se trata de um texto lavrado em PROSA POÉTICA, e se o deveria classificar como tal – segundo os critérios deste Recanto – apesar de estar apresentado em versos, e não em frases, como seria de se esperar de um exemplar característico da prosa. No entanto, a linguagem bem posta evidenciaria um melhor aproveitamento da emocionalidade espontânea do gênio criador. Acaso acatada a cirurgia no poema e possíveis substituições de vocábulos, ficaria um espécime bem caracterizador, acaso mantida a vontade de escrever um POEMA. Ganhariam autor e receptor. E poderia servir aos novatos como modelo. Um bom parâmetro para o diálogo.

(Enviado em 28/09/2009 14:20

para o texto: Contradições (T1833015) - Conceição Bentes).

– Do livro NO VENTRE DA PALAVRA, 2011.

http://www.recantodasletras.com.br/teorialiteraria/3125486