VERSOS SEM POESIA

Não reconheço a “ALDRAVIA” como novidade de forma poética, nem como genuinamente modelo brasileiro. No entanto, me parece importante que a todo o momento, se possível, a Poesia seja louvada como bem merece, mesmo que incorretamente aventada, o que induz aos expectantes que se está à busca de uma das facetas do Mistério. Não desejo polemizar porque isto não leva a nada, e acaba prestigiando somente os pseudopoetas que pretendem aparecer na mídia com algo que pareça ser original ou o Novo quanto ao pertinente à literatura. A originalidade é intrínseca à Poesia, independente de forma – que é o invólucro pelo qual é apresentada – e, em todos os exemplares aldravistas que vi até hoje, não consegui encontrar intrinsecamente a Poética, apenas uma proposta de discussão sobre forma e formato. O verso (com poesia) independe da forma, porque Poesia é espécie literária única do gênero Poética – a voz do Mistério. A Poesia (em si e por si) não é materialmente palpável ou tangível, pois trata-se de um estado de inquietação espiritual que dá origem à individualidade artística ungida pelo gênio criativo de seu autor: o poeta. O cadinho criacional ocorre em dois momentos: o da inspiração e o da transpiração, que podem ou não ser concomitantes ou simultâneos. Na espontaneidade original aportada na INTUIÇÃO, predomina a emoção, e no segundo momento, a razão faz o seu aporte, assentada na intelecção. E é neste último átimo da criação que resta fixada definitivamente a forma da peça poética. Muitos autores – como eu – entendem que a peça escritural nunca está pronta e a revisam várias vezes, aceitando o desafio que a estética verbal proporciona ao criador. Na atualidade formal, o POEMA é a materialidade do gênero POESIA, como foram, durante muitos séculos, o haicai, o soneto, o acróstico, a trova literária. No poema da contemporaneidade se constata a não exigência de versos silabados com esquemas de rimação e outras características identificadores da originalidade conceptual que compareciam na modalidade clássica. Só vale o ritmo, a musicalidade do verso. É o chamado VERSO BRANCO ou LIVRE, que carrega em sua conceituação formal o caos do pensamento metafórico atual. E é esta materialidade que permite a revelação da Poesia como gênero. Os regramentos da recém-nata “aldravia” são camisas de força para a expressão poética atual, tal como foram as formas anteriormente postas e conhecidas, no decorrer do classicismo. Repito: até agora não tive a alegria de encontrar nenhum exemplar deste formato (forjado para a facilitação da construção poética) que contivesse Poesia com P maiúsculo. Sim, porque há versos com POESIA e VERSOS SEM POESIA, e isto independe de forma ou formato – a essência é o que importa. Reitero: está-se discutindo FORMA, e eu – como analista literário – só me manifesto sobre o mérito de materialização poética que contenha Poesia. Claro, este é alinhavo e mérito pra quem é realmente Poeta (com P maiúsculo) e não somente confeccionador de forma e formato. Preocupo-me com o arremedo que é apresentado como se fora a representação do Novo, que nada mais é do que uma decorrência das formas e formatos clássicos. Buscam os eventuais cultores do retorno ao verso engessado a fácil popularidade. Poesia não se faz com forma e formato, e sim com talento intuitivo, estudo e muita leitura – para aprimorar o objeto estético como voz autônoma do mistério criativo.

– Do livro O CAPITAL DAS HORAS, 2014.

http://www.recantodasletras.com.br/teorialiteraria/4840406