Em defesa própria ( escondig-poema provençal em que o autor faz sua própria defesa).
Escondig pós-carnavalização
Não quero apenas defesa,
em todo teatro há a farsa
e a máscara que me disfarça
nenhuma lágrima represa;
vim ao júri popular
para ser transitado em julgado,
prescindo de advogado,
mas não do palhaço a pular;
menti, confesso menti,
menti para a colombina,
e mentira só combina
com a perigosa mente;
escondi pulo do gato
do aprendiz de feiticeiro,
só por causa de dinheiro
segredo vendi barato;
o prazer quis para mim
como amor não dividido,
vi nela sorriso partido
entre os lábios de carmim;
matei, sim, a colombina,
que me quis como arlequim,
fui beber em botequim
minha fúria assassina;
lá mexi com a esposa
do dono do ponto de bicho,
palhaço só sai do nicho
se leva na mão a rosa;
o bicheiro veio armado
me tirar satisfação,
mais rápida foi a ação
de quem me aprisionado
trouxe-me a este recinto
para justiça ser feita,
nos versos que a trova enfeita
com a justeza de um cinto
que amarra calça larga
à cintura do palhaço,
que não quis ter à ilharga
colombina em seu braço,
porque precisava amar
todas mulheres do mundo,
num átimo de segundo
antes de se esfumar.
Colombina, mil perdões,
matei-te somente em sonho,
no pesadelo medonho
de partir mil corações;
e ao júri digo e repito,
amei somente uma vez,
sou mera desfaçatez
da máscara que reflito;
mas quero prisão perpétua
ou até pena de morte,
destruí a minha sorte
na lembrança que é só tua;
Colombina, mil perdões,
matei-te somente em sonho,
no pesadelo medonho
de partir mil corações.
E ao ver-me repartido
entre difusas carências,
de mim tomo o partido
e declaro minha inocência.