A Afetividade e a Constituição do Sujeito na Psicogenética de Wallon

O papel do meio na constituição da pessoa

O conceito de meio é fundamental na teoria walloniana. Nela, como já foi acima referido, a pessoa constitui-se na integração de seu organismo com o meio, estando o social sobreposto ao natural. As atitudes das pessoas são consideradas complementares às do meio, tanto quanto determinadas pelas suas disposições individuais e pelo papel e lugar que ocupa no grupo social. Portanto, a pessoa deve ser vista integrada ao meio do qual é parte constitutiva e no qual, ao mesmo tempo, se constitui. A este respeito nos diz Wallon (1975) :

Sem dúvida que o papel e o lugar que aí ocupa [a criança] são em parte determinados pelas suas próprias disposições, mas a existência do grupo e as suas exigências não se impõem menos à sua conduta. Na natureza do grupo, se os elementos mudam, as suas reações mudam também. (p.20).

A constituição da pessoa se dá de acordo com suas condições de existência. O meio social e a cultura constituem as condições, as possibilidades e os limites de desenvolvimento para o organismo.

Durante a primeira etapa, denominada por Wallon de Estágio Impulsivo, os atos da criança têm o objetivo de chamar a atenção do adulto por meio de gestos, gritos e expressões, para que ele satisfaça as suas necessidades e garanta assim a sua sobrevivência.

Durante o desenvolvimento, a simbiose respiratória do feto se transforma em simbiose alimentar no recém-nascido e, por volta dos três meses, em simbiose afetiva, característica específica da espécie humana. A esta fase Wallon chama de Estágio Emocional.

A criança aos poucos aprende a contagiar o adulto com sorrisos e sinais de contentamento, o que caracteriza laços de caráter afetivo com aqueles que estão à sua volta, e demonstra necessidade de manifestações afetivas, necessidade que precisa ser satisfeita para que tenha um desenvolvimento satisfatório.

Para que a humanidade possa sobreviver, é necessário que a imperícia do recém-nascido afete o outro e provoque nele sentimentos de solidariedade; é a garantia de sobrevivência da espécie. Este, para Wallon, é o maior indicador de que o meio social é privilegiado para a criança em desenvolvimento, e para o homem adulto, em relação ao meio físico.

A criança, que está primeiramente ligada à mãe, aos poucos diferencia outras pessoas que desempenham papéis significativos em relação a ela, como, por exemplo, pai, avós, tios e padrinhos. Sua sociabilidade se amplia rapidamente quando começa a andar e a falar. Andando, a criança pode interagir mais com o ambiente que o cerca. A aquisição da linguagem a possibilita ao nomear objetos e pessoas, diferenciá-los.

Nesta etapa, denominada por Wallon de Estágio Sensório-Motor, a criança aprende a conhecer os outros como pessoas em oposição à sua própria existência.

É o tempo dos jogos espontâneos de alternância, do interesse por atos que unem duas pessoas ou, principalmente, papéis diferentes, como por exemplo, o jogo de dar e receber tapinhas, de esconder e ser escondido pela almofada, etc.

Gênese da inteligência e do pensamento

A gênese ou origem da inteligência para Wallon é genética e organicamente social. Isso então significa que "o ser humano é organicamente social e sua estrutura orgânica supõe a intervenção da cultura para se atualizar" (Dantas, 1992) . Então, o Desenvolvimento Cognitivo de Wallon é centrada na Psicogênese da pessoa completa ou total.

Henri Wallon reconstruiu o seu modelo de análise ao pensar no Desenvolvimento Humano , estudando-o a partir do Desenvolvimento Psíquico da criança.

Nesse contexto teórico, o Desenvolvimento da criança aparece descontínuo, marcado por contradições e conflitos, resultado da maturação e das condições ambientais, provocando alterações qualitativas no seu comportamento em geral. Ele realiza um estudo que é centrado na criança contextualizada, isto é, posta no ambiente imediato, social e histórico. Nesse contexto onde a criança é estudada considera-se o ritmo no qual se sucedem as etapas do desenvolvimento.

Essas etapas são descontínuas. Elas trazem em si mesmas as marcas dos conflitos, dos movimentos dialéticos, das rupturas ou cortes vivenciados, retrocessos e reviravoltas etc. Esses “conflitos” – pertencentes ao próprio crescimento humano – provocam em cada etapa, profundas mudanças nas anteriores.

A passagem dos estágios de desenvolvimento não se dá linearmente, por ampliação. Ela ocorre por reformulação, instalando-se no momento da passagem de uma etapa a outra, crises que afetam a conduta da criança. Conflitos se instalam nesse processo e são de origem ambiental – de fora para dentro - quando resultantes dos desencontros entre as ações da criança e o ambiente exterior.

O ambiente exterior ou exógeno é construído e estruturado pelos adultos e pela cultura. Já o ambiente endógenos – interno – é, segundo Galvão (1995) , produzido pelos efeitos da maturação nervosa – Sistema Nervoso Autônomo: SNA e Sistema Nervoso Periférico: SNP.

Esses conflitos são propulsores ou estimuladores do Desenvolvimento/ Aprendizagem Humanos. O desenvolvimento das funções depende tanto de condições de maturação como de exercícios capazes de desenvolvê-las, portanto condições do meio. No estágio sensório-motor, a criança realiza um extenso e diferenciado acordo entre as percepções e os movimentos. Esta relação em sua forma mais simples é o ato reflexo, ou seja, a uma determinada excitação corresponde um determinado movimento. Com a maturação neurológica, os reflexos são inibidos e a criança se torna capaz de realizar exercícios sensório-motores que conduzem a um duplo resultado: ligar o efeito perceptível aos movimentos próprios para produzi-los, e diversificar os movimentos e os efeitos possíveis. Coordenando mutuamente os campos sensorial e motor, completa-se o arranjo funcional da atividade conforme as suas atividades objetivas.

É a ação motriz que regula o aparecimento e o desenvolvimento das funções mentais. O movimento espontâneo se transforma aos poucos em gesto, que, ao ser realizado a partir de uma intenção, se reveste de significação ligada à ação, voltada para a realização da cena, fora da qual nada significa.

O desenvolvimento das funções psicológicas superiores se dá, portanto, a partir do desenvolvimento das dimensões motora e afetiva. É a comunicação emocional que dá acesso ao mundo adulto, ao universo das representações coletivas. A inteligência surge depois da afetividade, e a partir das condições de desenvolvimento motor, e se alterna e conflitua com ela.

A cognição é vista como parte da pessoa completa que só pode ser compreendida integrada a ela, cujo desenvolvimento se dá a partir das condições orgânicas da espécie, e é resultante da integração entre seu organismo e o meio, predominantemente o social. Assim, o desenvolvimento é condicionado tanto pela maturação orgânica, como pelo exercício funcional, propiciado pelo meio.

Jeimes Paiva
Enviado por Jeimes Paiva em 18/06/2008
Código do texto: T1040685
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