Batismo: a porta de entrada (SERMO LXXII)

BATISMO: A PORTA DE ENTRADA

Vão e batizem a todos... (Mt 28,19)

Para começo de conversa, devo dizer que modernamente, a partir do Catecismo, a Igreja aceita a classificação do Batismo e da Crisma entre os chamados “sacramentos de iniciação cristã” a partir do fato de que o Batismo é o primeiro sacramento, e a Crisma, confirmadora deste, torna-se agregada ao processo de iniciação.

Há antigas correntes, de teologia e liturgia que acrescentam aos sacramentos de iniciação a Eucaristia. Isto se pode encontrar nos clássicos dos primeiros séculos. O Catecismo também coloca a eucaristia entre os sacramentos da “iniciação”, teoria esta que não é desposada por todos os teólogos e liturgistas.

Acontece que na Igreja dos três primeiros séculos o catecúmeno (adulto) recebia os três sacramentos numa mesma cerimônia. Batismo e Crisma são, a rigor, sacramentos semelhantes. O Batismo significa a admissão na Igreja; a Crisma confirma essa admissão. A pessoa recebe, por ocasião de sua concepção, a vida natural, biológica. Através do Batismo ela entra no gozo da vida espiritual, sobrenatural.

Nesse contexto, observa-se que o Batismo é o primeiro gesto redentor de Cristo, e tem força de tornar, aqueles que o recebem, Igreja-comunidade, membros da família de Deus e limpos do pecado original. Desta forma, o Batismo é o ponto inicial de nossa caminhada com Cristo na e para a comunidade eclesial, para o encontro com Deus aqui-agora e na eternidade. Pelo Batismo o cristão aceita viver como filho de Deus, membro da Igreja, responsável por uma missão. O batizado converte-se, missionariamente, num salvo para salvar.

Normalmente, o valor das coisas é medido pelo esforço e pelos sacrifícios que custou para obtê-las. Uma mãe sabe bem os sobressaltos e riscos que passou para dar à luz um filho. Cristo não só passou por um risco, mas morreu pela humanidade. Por esse gesto, é necessário às pessoas uma valorização adequada a seu Batismo.

No Batismo estão implícitos os eixos fundamentais de nossa fé: a morte e a ressurreição de Cristo. Batizados, participamos de sua morte e ressurreição. Como um sacramento de iniciação, o Batismo é um nascimento para a vida sobrenatural, para a Igreja, para o Reino dos céus. Sendo a Igreja uma comunidade (ekklesía, uma assembléia de convidados), o Batismo, comunitário que é, é um ato em que toda a Igreja batiza.

Nesse nascimento místico, a Igreja dá a seus membros o direito de serem educados na fé, de usufruirem dos seus bens espirituais, tornando os batizados seus membros, filhos do Pai e templos do Espírito. Junto com isso, entretanto, o fiel assume deveres para com Cristo e a Igreja. A criança quando nasce recebe um nome civil: Ana, Antonio, Helena, Sérgio, Maria...Todos nós gostamos de nosso nome. É preciso honrar o “bom nome da família”...

O batizado recebe um nome familiar e particular: Cristão! Filho de Deus! Por isto deve, igualmente, honrar esse nome, tudo fazendo para mantê-lo limpo. As pessoas se orgulham de vincular seu nome a cargos e graduações humanas: filho do ministro! irmão do prefeito! sobrinho do capitão! Isso, de certa forma, é importante. Mas há algo mais sério, um título muito mais importante, e que poucas pessoas usam-no ou dele se orgulham: FILHO DE DEUS! E é o Batismo que dá esse título às pessoas, não o dinheiro, nem laços de sangue, mas o amor de Deus em acolher suas criaturas. No terreno dos conceitos e conseqüências pastorais sobre Batismo, vamos encontrar:

• primeiro gesto redentor de Cristo (quando a ele aderimos

pela fé);

• torna-nos participantes da Igreja-comunidade;

• dá-nos um lugar único na família de Deus, com igual

dignidade dos demais;

• lava-nos do pecado original.

Diz a tradição que, desde o dia de Pentecostes a Igreja celebra e administra o Batismo. O sacramento batismal sempre aparece ligado à fé: “Tenha fé no Senhor Jesus e serás salvo, tu e tua família” (At 16, 31ss).

Os antigos “Pais da Igreja” afirmavam, na Didascália (a doutrina dos doze apóstolos): “Se alguém não recebe o Batismo não recebe a salvação”. Desse mesmo período é a reveladora afirmação de São Cipriano († 304): “Extra Ecclesia nulla Salus” (Fora da Igreja não há salvação!). Eis o texto patrístico atribuído ao santo:

Há um só Batismo, e este deve ser realizado dentro da única Igreja Católica, pois fora da Igreja não há salvação. Todos os que estão fora dela pertencem aos mortos.

O ecumenismo, mais precisamente depois do Vaticano II, tem manifestado um esforço no sentido da integração dos batismos das Igrejas cristãs. O santo Batismo, como dizia a novel Igreja de Roma, é fundamento de toda a vida cristã, o pórtico, a janela da vida no Espírito (vitae spiritualis ianua) e a porta que dá acesso aos outros sacramentos. Libertando-nos do pecado e regenerando-nos para a filiação divina, “...ele torna-nos membros do corpo místico de Cristo, incorporados à Igreja e partícipes de sua missão”. (CIC 1213; CDC 204; DS 1314).

Assim como os alicerces sustentam a casa, o Batismo é base para a vida espiritual, arrancando o ser das trevas do pecado original para a luz dos filhos de Deus. “Parece que Justino († 165) foi o primeiro dos autores cristãos a empregar o termo mistério para indicar o Batismo. Ele designa, portanto, esta realidade sacramental da Igreja como a passagem visível do homem, das trevas para a participação na luz de Cristo. Iluminado no espírito pela verdade, o batizado é subtraído às trevas e ao domínio dos principados e das potestades.

Etimologicamente, batismo quer dizer mergulho, imersão, derivado do verbo baptisôo (imergir ou mergulhar).Talvez por isso, levando a etimologia ao pé da letra, algumas igrejas ou seitas fundamentalistas não aceitam o gesto de derramar água sobre a cabeça do batizando, afirmando ser necessária a imersão total.

O importante não é a forma como a matéria é ministrada, mas a essência do Batismo em si, e a fé do que recebe o sacramento. A entrada no Reino de Deus se realiza mediante a fé na Palavra de Jesus, selada pelo Batismo, testemunhada no seguimento, no compartilhar sua vida, morte e ressurreição (cf. Rm 6,9). Isto exige uma profunda conversão, uma ruptura com toda forma de egoísmo num mundo marcado pelo pecado, ou seja, uma adesão ao anúncio das bem-aventuranças.

No Batismo, como nos demais sacramentos, é o próprio Cristo que, por um ministro ou representante, preside o rito e, por isso, garante sua eficácia. É o divino Redentor quem batiza através da Igreja, ensina, rege, liga, oferece e sacrifica.

Através do sacramento do Batismo, o cristão torna-se, como Cristo, sacerdote, profeta e servidor. É um equívoco pensar-se que só bispos e presbíteros são chamados a ser profetas de Cristo. O que confere a dignidade aos cristãos, antes e acima de qualquer sacramento, é o Batismo.

O cristão sacerdote não é necessariamente aquele pertencente à hierarquia ou a alguma ordem sacra do clero. Sua consagração se origina na dignidade de seu Batismo, e se converte em um sacerdócio comum, missionário, inerente a seu estado de vida. O cristão consagra sua vida e suas realidades temporais a Cristo. O sacerdócio ministerial e dos fiéis são complementares. Como ensina o Vaticano II (LG 10,2),

Por seu lado os fiéis, em virtude do seu sacerdócio régio, têm também parte na oblação da eucaristia e exercem o mesmo sacerdócio na recepção dos sacramentos, na oração e na ação de graças, através do testemunho duma vida santa, da abnegação e da caridade operante.

A isso refere-se a menção ao “reino de sacerdotes” que consagram o mundo a Deus (cf. Ap 5,9s). O ser profeta, igualmente originário do Batismo cria no cristão um direito e um dever de anunciar os projetos de Deus, denunciar os obstáculos à instauração desses projetos, e animar a comunidade através de seu testemunho. Nessa conformidade, o batismo torna os cristãos insertos no munus profético de Cristo, legítimos sinais do Ressuscitado.

Por último, a missão real que o Batismo confere, transforma o cristão em rei, mas não rei com corte, coroa e mordomias. No cristianismo ser rei equivale a ser servidor, a estar disponível ao serviço em favor do Reino e da comunidade. Nesse ministério os fiéis se tornam reis vencendo suas próprias paixões (cf. Rm 6,12).

Na mudança das trevas do pecado para a luz da graça de Deus, ocorre no batizado a mudança de vida semelhante a um renascer, quando passamos da morte para a vida, do pecado para a graça, caímos com Adão e nos levantamos (anástassys = ressurgir) com Cristo (cf. Rm 5, 21-12).

Por ser um sacramento que dá partida ao processo de salvação do ser humano, o Batismo possui uma dimensão antropo-soteriológica. Pela inserção dos homens na comunidade salvante Igreja, o Batismo torna-os integrantes do número de eleitos que se encaminham à salvação. Em sua dimensão eclesial (ou até eclesiológica), o Batismo aparece como um sustentáculo da fé, através do qual virá a salvação.

Por este motivo, os movimentos puristas dão ênfase ao Batismo de adultos, onde o sacramento ocorre como função e conseqüência da fé daquele que o recebe. Tertuliano († 220 d.C) nos dá significativas luzes sobre o mistério batismal:

Quão numerosos são, pois, os favores da natureza, os privilégios da graça, as solenidades rituais, as figuras, a antecipação, e as profecias, todas orientadas para o culto da água. Primeiro é o povo liberto do Egito que, atravessando a água, escapa ao poder do rei egípcio. A água extinguiu o rei (a figura do mal) e todo o seu exército (Ex 14).

Que figura mais esclarecedora do sacramento do Batismo! Do mesmo modo, a água, de amarga convertida em suave, pelo efeito do bastão de Moisés (Ex 15,25). Esse bastão era Cristo que transformou as artérias da água, antes envenenadas e amargas, em águas, suaves do Batismo por sua própria pessoa. Esta é a água que afluía da pedra para o povo que o acompanhava (Ex 17,6). Se, com efeito, Cristo é esta pedra (1Cor 10,4), não há dúvida que, por esta água saindo do lado de Cristo, é santificado o Batismo.

O Concílio de Trento afirma que o “lavacro da renovação” (o Batismo) é absolutamente necessário para a salvação do homem. A fórmula trinitária do Batismo (deriva de Mt 28,19) otimamente exprime que o batizado unido a Cristo está ao mesmo tempo em comunhão com outras duas pessoas divinas. O crente, com efeito, recebe o Batismo em nome do Senhor Jesus e pelo Espírito de Deus (1Cor 6,11); torna-se templo do Espírito (v.19), irmão e co-herdeiro de Cristo, vivendo-o intimamente em sua vida e destinado a partilhar sua glória (cf. Rm 8,2.9.17.30; Ef 2,6).

Para os cristãos, o Batismo é o início de uma história de fé. Por fé, nada mais adequado que a definição do autor da Carta aos Hebreus:

É um modo de já possuir aquilo que se espera; é um meio de

se conhecer as realidades que não se vêem (11,1).

No Batismo das crianças, por exemplo, essas são batizadas in fide Ecclesiae (na fé da Igreja), de modo antecipatório. Nesse caso, a comunicação de Deus opera como “graça preveniente”, onde a confissão de fé é feita, representativamente, por pais e padrinhos. Oportunamente detalharemos esse assunto.

Os judeus não costumavam batizar pessoas. Havia entre as civilizações antigas a prática de banhos sacros de purificação. Há vestígios desse costume no Egito, na Babilônia, na Índia, junto aos rios Nilo, Eufrates e Ganges. O sentido situava-se mais na linha de uma purificação de impurezas morais, buscando acréscimo de forças vitais.

O Batismo penitencial de João Batista (Mt 3,1-12), na água do Jordão, era praticamente desconhecido em Israel, que conhecia somente banhos de purificação, como práticas de limpeza pessoal, contra a lepra (Lv 14,8), impurezas sexuais (15, 16.18), contato com cadáveres (Nm 19,19). O judaísmo tardio passou a usar o Batismo de imersão, após o século II d.C. para a iniciação dos prosélitos pagãos. A iniciação dos judeus era diferente.

Os recém-nascidos do sexo masculino eram circuncidados. Essa extirpação da pele do prepúcio tinha diversos significados: religioso, racial-nacionalista e higiênico. Há relatos de circuncisão, além de em Israel, em árabes e povos da Ásia Menor. Aos doze anos, no “Bar-mitzvah”, como uma confirmação, os meninos eram admitidos na comunidade e no Templo.

Quando Jesus fala em “nascer de novo” (cf. Jo 3,3s), Nicodemos, apesar de doutor do Sinédrio, não entende. A informação de que era necessário nascer de novo deixou confuso o doutor (vv.3-4). Como Jesus não faz jogo de palavras, esclareceu que era preciso nascer da água e do Espírito para poder entrar no Reino (vv. 5-7).

O Batismo é, portanto, esse nascer de novo, pela água e pelo Espírito, através do fogo que purifica, que dá o renascimento espiritual, abertura para uma vida nova, cujo ápice é o Reino. O Batismo e a Crisma incorporam o leigo, como os demais, a Cristo e o fazem membro da Igreja. Por isso ele participa - como vimos - a seu modo, da função sacerdotal, profética e real de Cristo, “...e a exerce em sua condição específica no coração do mundo e no coração da Igreja. Ele está comprometido com a construção do Reino, em sua dimensão temporal” (LG 4).

Apenas para esclarecer, leigo não é, como pejorativamente é chamado, quem não sabe nada, quem está por fora. O vocábulo leigo laikósé formado por laós (do povo) e ikós (alguém que pertence a uma determinada categoria: no caso, ao povo).

Com vimos, quando tratamos dos sinais, o Batismo, junto com a Ordem e a Crisma, são sacramentos indeléveis. Administrados uma só vez, para efeito e eficácia perpétuos. Embora se fale de muitos efeitos do Batismo, na verdade, teologicamente, só há um, e os outros são conseqüências dele.

O efeito do Batismo é a justificação (cf. At 2,38), que é a geração para a vida divina e infusão, na pessoa, da graça santificante e das virtudes teologais e morais. A justificação incorpora o homem a Cristo. Por ele despoja-se do homem velho (morte, pecado) e reveste-se do homem novo (vida, graça, ressurreição), semelhante a Cristo (cf. Ef 4, 22ss; Cl 3,10). Por ser inconsútil, a túnica de Cristo (cf. Jo 19,23) não pôde ser dividida. Ela exprime a unidade de sua doutrina. No Batismo, os cristãos se revestem dessa túnica, passando a fazer parte da unidade de Deus. Opoerunamente falaremos sobre o "batismo das crianças".

Santo Inácio de Antioquia, numa analogia com o uniforme militar, compara o Batismo com um escudo, enquanto a fé é o capacete, o amor a lança e a paciência a armadura. E conclui “Vossos fundos de reserva são vossas obras, para receberdes, um dia, os vencimentos devidos”.

A liturgia batismal é riquíssima em significados. Seus principais gestos são,

• a água: símbolo da vida, da limpeza;

• a vela: simboliza o Cristo (A Luz do Mundo), a fé, e a missão

(Vocês são a luz do mundo!);

• a veste branca: representa a graça, o revestir-se da roupa

do homem novo, dos méritos e do poder de Cristo;

• a unção com o óleo: a cura e a fortaleza ( ungiam,

massageavam atletas e lutadores antes de entrar nos

estádios);

Como afirma o teólogo Carlos Mesters, “Não basta ao homem nascer do homem. É preciso também nascer de Deus” (cf. Jo 1,13; 3,5). Essa afirmação quer nos dizer que, por mais rica e abundante que seja a vida humana, física e material, para ser completa e fecunda ela precisa nascer a partir de Deus, e para esse nascimento, a sabedoria divina nos deixou o Batismo. É pena que no Brasil, hoje em dia, o Batismo, às vezes deixa de ser um ato de fé para tornar-se algo incluso na simbólica social, para não dizer pagã.

Também chamado de banho de regeneração e de renovação no Espírito Santo, o Batismo significa e realiza esse “nascimento”, sem o qual não há nem vida nem Reino. Sua característica libertadora (liberta do pecado) vem tipificada na libertação do Egito, na passagem do mar.

Oh! Deus, que fizeste passar a pé enxuto pelo Mar

Vermelho aos filhos de Abraão, para que o povo libertado

da escravidão do faraó fosse imagem da família dos

batizados...(Bênção da água batismal, na Missa da Aleluia).

O Batismo é um sacramento que, como os demais, exige o pressuposto da fé (cf. Mc 16,16). A fé se vive na Igreja-comunidade, na assembléia dos que crêem. A fé, como as demais virtudes teologais infusas no Batismo, precisa ser constantemente ajudada, alimentada, cuidada. A fé é como uma flor, uma planta frágil que precisa de constantes cuidados. A fé batismal não é uma fé adulta, perfeita, madura, mas um começo. Ela precisa desenvolver-se. Ao catecúmeno (ou aos pais e padrinhos) se pergunta: “Que pedes à Igreja de Cristo?” A resposta deve ser “A fé!”.

Os sinais do Batismo

A teoria neoplatônica dos sinais, levantada por Santo Agostinho é modificada por Santo Tomás de Aquino a partir do eixo de raciocínio do enfoque da matéria e da forma, à semelhança das substâncias da filosofia de Aristóteles, onde a matéria representa algo acidental, que pode assumir essa ou aquela conformidade, e a forma, ao contrário, traz consigo o componente essência. No hilemorfismo aristotélico, matéria e forma compõem a essência de um ser ou de um processo. O elemento visível (água, óleo, pão) ou ação sensível(o amor dos nubentes, ou o arrependimento dos pecados) são a matéria do sacramento, enquanto as palavras (fórmula canônica, para a eficácia) do ministro celebrante, são a forma, conferindo a graça do sacramento. Todos os sacramentos possuem os seguintes sinais sacramentais: matéria, forma, ministro, efeitos e gesto. No Batismo, especificamente:

• matéria: a água e o óleo;

• forma: “Eu te batizo, em nome do Pai, do Filho e do Espírito

Santo”;

• ministro: o padre (ordinário); diáconos ou leigos

(extraordinários);

• efeitos: a graça (a justificação), a comunhão trinitária e

comunitária (eclesial);

• gestos: o sinal da cruz e a imposição das mãos.

Algumas coisas práticas

Por que batizar crianças ? Por que não esperar que ela escolha, ao atingir a idade da razão, se quer ser batizada? Batizá-la em criancinha, não seria uma violação de seus direitos? Estas perguntas, volta-e-meia se escuta por aí. E é de perguntar: mas não dão comida? Por que não esperam para ver se ela quer comer? não dão vacinas ? A vacina dói! Por que não a consultam antes? Por que põem roupas? Será que é aquela roupa que ela quer? E o nome? Foi escolhido pela criança? E aquela camiseta do Grêmio, do Flamengo ou do Palmeiras que lhe vestiram, com poucos dias de vida? Será que aquele vai ser seu clube? Não serão, sob a mesma ótica, todos esses atos praticados pelos pais, uma violação dos direitos da criança? Não! dirá a mãe, mas roupa, alimento, vacina, nome, isso é necessário... Certo! Assim como estas coisas, o Batismo, por gerar vida no Espírito, também é necessário! Absolutamente necessário!

A criança tem direito à vida, biológica e espiritual. Negar-lhe o Batismo é mesmo que abortá-la. É um aborto espiritual. É preciso que os pais vejam a criança num contexto familiar e comunitário. No início de sua vida ela depende de uma série de atos, aos quais tem direito, mas ainda não pode praticá-los sozinha. Eles são úteis, necessários e importantes. Ela tem direito à vida, ampla e abundante, e a tudo que é necessário para a normalidade dessa vida. Conferindo o Batismo às crianças, não se viola a liberdade destas, assim como não se viola a liberdade se os pais aceitam, em seu nome, uma herança que um parente generoso quis deixar-lhe.

Assim sucede com relação ao Batismo. A negativa ou retração, na verdade, não se trata de ponto de vista ou convicção dos pais, mas, em geral, preguiça, medo de assumir um compromisso ou até desconhecimento do real valor do Batismo.

Por último, algumas coisas sobre os padrinhos. Estes são aqueles que, junto com os pais, testemunham a fé cristã junto à criança. Dão um aval de fé. Devem ser pessoas responsáveis (nem muito jovens nem muito idosos), conscientes, de vida regular (sem maus antecedentes, amasiados, ateus ou de práticas sexuais duvidosas). Devem ser católicos, praticantes, pertencentes, preferencialmente a uma comunidade. Evitar interesses, conveniências...

A festa do Batismo é o ato religioso. Não se deve transformar o batizado dos filhos numa festa pagã. A preparação é indispensável. Antes do nascimento os pais preparam tudo: escolhem o nome, preparam o quarto, o enxoval, escolhem os padrinhos. Não querem estar desprevenidos quando a criança chegar... E o batismo?

Por que não o preparam também com antecedência? Pais e padrinhos podem participar de “encontros preparatórios” mesmo antes da criança nascer. Por último: a criança deve ser batizada na paróquia/comunidade onde a família vive. Não é recomendável batizar nessa ou naquela igreja porque o templo é mais bonito, ou porque o padre fala melhor, ou outros motivos.

Na Igreja existem quatro tipos de Batismo:

• comum ou convencional

É o mais conhecido, o tradicional; o Batismo litúrgico,

através da água e de rito próprio;

• de desejo

É feito quando o catecúmeno (aquele que vai se batizar) ou

a comunidade (família) expressa o desejo de fazer o

Batismo. No caso do falecimento da pessoa, ela foi batizada

in voto, e está ordenada á Igreja, pelo desejo de salvação

da comunidade;

• de sangue

Acontecia mais nos primórdios da Igreja: alguém (adulto)

sofria martírio por causa de sua fé, antes do Batismo; sua

morte (seu sangue) funcionavam como rito batismal;

• de emergência

Em caso de perigo de vida, antes do Batismo - qualquer

pessoa - pode batizar; basta derramar um pouco de água na

cabeça da criança, e dizer: “Eu te batizo, em nome do Pai,

do Filho e do Espírito Santo”, traçando o sinal da cruz na

testa da criança. Se a criança morrer, foi batizada. Se

sobreviver, deverá receber, oportunamente, o Batismo

comum.

Dou a seguir, para quem quiser anotar, alguns subsídios bíblicos sobre o sacramento do Batismo: Antigo Testamento: Gn 6-9; Ex 14; Sl 51,9.12s; Ez 36, 24-28; Novo Testamento: Mt 3,13-17; 28,19; Mc 1,4-8; 16,16; At 16,30s; 1Cor 10,1s; 6,17; 1Pd 3,20s.

Conclusão

O Batismo é a porta de entrada na Igreja. Por ele temos acesso à graça de Deus, às promessas de Jesus e às luzes do Espírito Santo. Sua instituição e preceito estão positivamente marcados nos seguintes textos: “Em verdade vos digo, disse Jesus a Nicodemos, quem não renascer da água e do Espírito Santo, não pode entrar no reino de Deus” (Jo 3, 5). “Ide, ensinai todas as gentes, disse Jesus a seus discípulos, batizando-as, em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo” (Mt 28,19). “O que crer e for batizado, será salvo” (Mc 16, 61). “Recebe o batismo e lava os teus pecados”, disse Ananias a Saulo (At 22, 16). O batismo nâo é uma representação nem um ato solene de um só dia. ele deve ser vivido, conservado e desenvolvido. Cabe às famílias e aos padrinhos zelar pela saúde espiritual do batizado, levando-o a professar a virtude e o amor que brotam da graça batismal.

Trecho de uma pregação levada a efeito em Vitória, ES, em 2009, na Semana Nacional do Catequista. O autor é Teólogo Leigo, Biblista com especialização em exegese e Doutor em Teologia Moral. autor, entre outras obras, de “Eu te batizo” (Ed. IGL, 1986) e “Sacramentos: Sinais do amor de Deus” (Ed. Vozes, 2ª. edição)