PAULO EIRÓ: ENTRE A POESIA E A LOUCURA

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Notas Biográficas

 

Paulo Francisco Emílio de Sales, o poeta Paulo Eiró, nasceu quando Santo Amaro, ainda era Município, em 15 de abril de 1836. Seu pai era o Professor Antônio Francisco das Chagas.

Aos 11 anos se apaixonou pela prima Cherubina Angélica de Salles, que foi sua musa por toda a vida. Aos 19 anos formou-se pela Escola Normal de São Paulo e foi nomeado professor em Santo Amaro, exercendo o magistério por oito anos com intervalos.

Nos primeiros anos de magistério, a vida de Paulo Eiró foi tomada de uma verdadeira febre para a poesia, consequência da paixão que sentia pela prima e musa; porém, a esperança de conquistá-la, terminou ao saber que sua musa estava de casamento marcado. Daí por diante, ele começou a ficar absorto nas aulas, e passou a caminhar pelos lugares próximos a vila, trazendo, sempre, o olhar perdido no chão. Gastava o dia inteiro nesses passeios, não almoçava e nem jantava, sentia enfadamento em tudo. Somente quando entrou para a Faculdade de Direito, e transferiu sua residência para São Paulo, viu-se tomado de dias melhores. Mas as esquisitices da Vila, que já haviam desaparecido, retornaram de uma hora para outra. Fechava-se no quarto, não almoçava, não jantava. Às vezes seguiam-se dias de entusiasmo e bastante estudo até a próxima crise. A família preocupada trouxe-o para Santo Amaro.

Não demorou muito, Paulo inflamou-se no desejo de matricular-se no Seminário e não aceitava conselhos para demover tal idéia. Recolheu-se ao Seminário Episcopal no Bairro da Luz. Neste período, já contava com 23 anos e era considerado pelos colegas do Seminário um velho. Com o seu humor novamente em crise perambulava pelo quarto, ou então, espalhava pelo Seminário suas poesias tristes e abolicionistas, motivo pelo qual foi aconselhado a voltar a Santo Amaro; a seu pai foi sugerido que destruísse os cadernos com suas poesias, o que foi feito.

De volta a casa, resolveu, desta vez, viajar, a pé, a Mariana (MG); novamente os conselhos de nada adiantaram. Da viagem, pouco se sabe, a não ser, que não conseguiu chegar ao destino. Vamos reencontrá-lo, voltando para São Paulo, sem a bagagem, tendo no bolso apenas um gasto livro de anotações.

Ao entrar na cidade, sente uma movimentação nas proximidades da Praça da Sé, e resolve ir até lá. Tomado de curiosidade, entra na Igreja. Era um casamento, mas ao reconhecer a noiva vê que é a sua musa, a mulher que ele tanto amou e que agora se casava. A esperança estava perdida para sempre. Até os padrinhos eram seus amigos e parentes, mas ninguém notou sua presença. Saindo da igreja, põe-se, a pé, a caminho de Santo Amaro. Veio compondo este soneto:

FATALIDADE

Que vista! O sangue se afervora e escalda!

Por que impulso fatal fui hoje à Igreja ?

Quer meu destino que, ao entrar, lá veja

Noiva gentil de cândida grinalda.

Nos olhos sem iguais, cor de esmeralda,

Lume de estrelas, plácido lampeja:

Seu branco seio de ventura arqueja;

Louros cabelos rolam-lhe da espalda.

Hora de perdição! Sim adorei-a;

Não tive horror, não tive sequer medo

De cobiçar uma mulher alheia.

Unem as mãos; o órgão reboa ledo;

Em alvas espirais, o incenso ondeia...

E eu só, longe do altar, choro em segredo!

Na volta a casa, foi convidado pela Comissão dos Festejos pelos 36 anos de S.M. Imperial D. Pedro II, a ceder os originais do drama Sangue Limpo que seria representada em São Paulo. Paulo Eiró participou da montagem, marcação das cenas e dos ensaios com grande entusiasmado. Ele havia reencontrado a lucidez.

No dia 2 de dezembro de 1861 (dia das comemorações), foi encenado o espetáculo com a presença dos figurões do Governo, estudantes, e quase todos os moradores de São Paulo.

Sangue Limpo é um drama que tem por cenário São Paulo nos dias da Independência e situa um caso de amor entre um fidalgo e uma jovem parda. O preconceito é vencido pelo rapaz que se rebela contra o pai, ao mesmo tempo em que este é assassinado por um negro que jurara nunca mais ajoelhar-se aos pés de um senhor. Na cena 12 do ato II, temos a fala em que Rafael, irmão da jovem mestiça, responde ao fidalgo que lhe perguntara se corria sangue escravo em suas veias:

— Sou filho de um escravo, e que tem isso? Onde está a mancha indelével?… O Brasil é uma terra de cativeiro. Sim todos aqui são escravos. O negro que trabalha seminu, cantando aos raios do sol; o índio que por um miserável salário é empregado na feitura de estradas e capelas; o selvagem, que, fugindo a colonização, vaga de mata em mata; o pardo a quem apenas se reconhece o direito de viver esquecido; o branco, enfim, o branco, que sofre de má cara a insolência dos mais ricos e o desdém do governo. Oh! Quando caírem todas essas cadeias, quando esses cativos todos se resgatarem, há de ser um belo e glorioso dia!

Apesar da emoção de ver sua peça encenada, as críticas não lhe foram favoráveis e, ao lê-las, decepciona-se, retornam então as crises.

Nos próximos dois anos Paulo Eiró dedica-se, em meio a crises, a dar aulas na escola primária em Santo Amaro; mas as alternâncias da sua demência obrigaram os familiares a pedir seu afastamento. As viagens ficavam cada vez mais freqüentes. Havia períodos em que não se tinha noticias dele, sem noção do tempo retornava a sua casa. Sua saúde estava cada vez mais precária e a família criou o hábito de deixar o portão fechado para que ele não fugisse.

Mas, num domingo, pela manhã, ele encontra o portão aberto, atravessou a Vila e entrou na Igreja de Santo Amaro. Era hora da missa e todos estavam presentes e sem que a sua família o notasse, começou a interferir no que o padre falava. Todos ficam pasmados ao ver sua ousadia de falar durante a Santa Missa, seu pai, leva-o de volta para casa, mas só toma consciência que era hora de interná-lo quando ele quebra um crucifixo.

Em maio de 1866, Paulo Eiró, aos 31 anos, foi internado no Hospício dos Alienados que se localizava na várzea do Carmo na Rua Tabatinguera em São Paulo. Durante cinco anos ele definha, entre crises de demência e lucidez. Então no dia 27 de junho de 1871 faleceu Paulo Emílio de Salles, o poeta Paulo Eiró, no Hospício dos Alienados, de meningite, aos 36 anos de idade. ®Sérgio.

Leia também: (clique no link)

Cartas de Álvares de Azevedo.

Augusto dos Anjos, O Poeta Brigão.

Os Infortúnios de Gonçalves Dias.

Junqueira Freire, O Poeta da Amargura.

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Ajudaram na composição do texto: http://www.sampa.art.br/biografias/pauloeiro/ / Gonçalves, José. Paulo Eiró - Notícia bibliográfica, IN: Sangue Limpo, 1949.

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