O PAPAGAIO BISBILHOTEIRO

Pretinha, era uma escrava muito invejada por ser a cozinheira preferida na fazenda. Salvou à vida de seu sinhô, numa ocasião em que botaram veneno em sua comida, ganhando como recompensa sua carta de alforria. O papagaio que bisbilhotava tudo que ocorria, andado pelas travas da casa, chamou sua atenção dizendo: - Alguém mexeu no prato do sinhô!- Alguém mexeu no prato do sinhô!... - Quem foi meu louro? Indagou a escrava – Isso eu não posso dizer só vi a pessoa pelas costas! É uma mulher e usava uma roupa enorme!

Prevendo que algo de mal poderia estar ocorrendo, ao notar que o prato de comida deixado sobre o fogão de lenha não estava de acordo, ela, por precaução deu um pouco da comida a um cão da fazenda, Ele farejou e recusou a comer. Segundos após os mosquitos que se juntaram na comida, estavam todos mortos.

Além da alforria ela ganhou uma bela e confortável casinha no pé da serra. Donde podia contemplar a linda cachoeira que cantava dia e noite despencando do alto, rolando entre as sempre vivas que cobriam a encosta com seu colorido amarelo, contrastando com os cristais da água que saltavam de encontro às pedras e descia formando o riacho que passava na porta de sua casinha indo abastecer a sede da fazenda.

Uma maravilhosa paisagem desenhada nos momentos de inspiração pelo criador universal. As matas ciliares ribeirinhas ao riacho que perfumavam o ambiente exibiam néctares de pétalas coloridas, desgarradas das flores pelo vento que soprava sem rancor.

Já idosa a pretinha Isaura, que amamentou os filhos de sua sinhá, era respeitada por todos eles, que carinhosamente a chamavam de mãe Criola. Tomou famosa pelos dotes que possuía, e por algumas curas milagrosas a ela atribuídas, através de suas orações e rituais trazidos de sua pátria de origem. Sua mãe África conforme afirmava.

Em noites de luar naquele cantinho singelo pairava tranqüilidade e paz. A brisa suave que subia o riacho carregando os aromas da natureza entrava pela porta da frente, percorria os cômodos de sua humilde casinha, passava pelo pequeno altar roçando de leve as imagens ali expostas tomava emprestada um pouco de fé levando-a a ilustrar campos e várzeas numa verdadeira oração. O sereno nas folhas secas refletia a magia do luar com sua doce candura. Naquela magnífica e esplendida geografia coberta de verde, os respingos de orvalho caindo das folhas desequilibradas ao balanço da brisa formavam pérolas multicores.

Esse pequeno cenário que parecia um pedacinho de céu aguçava a fúria de Miquelina, antiga parteira, destituída quando a população descobriu o quanto era meiga e doce a bondosa mãe Crioula. Aperreada a bruxa tinha sede de vingança. Sempre armando, ela tentava vingar a pretinha Isaura. Fingindo amabilidade a cercava de agrados, mas sua fé sempre a defendia.

Sô Neco adorava a feijoada preparada por mãe Crioula. Mais um motivo de ciúmes para Miquelina. No grande mutirão de capinas das roças que todos os anos se promoviam na fazenda, a feijoada preparada pela escrava pretinha era a iguaria mais apreciada. Reuniam-se os fazendeiros das redondezas, convidados pelo anfitrião para saboreá-la na grande festa.

Embora não fosse bem quista, Miquelina estava sempre entre as voluntárias da vizinhança que ajudavam no preparo da festa. Contando que a feijoada era de exclusiva responsabilidade da Pretinha; disso seu Neco não abria mão. Naquele entra e sai de cozinheiras o papagaio com seus palpites era admirado por umas, esculachado por outras, nada passava sem que ele palpitasse.

Tudo pronto chegou o momento em que a sinhá receberia o pé de milho, entregue pelo escravo que puxava a dança, conforme rezava o ritual folclórico do mutirão. Todos no pátio a frente da casa grande as cozinheiras com suas vestes brancas davam um toque todo especial aquele acontecimento folclórico. Eis que de repente, gritos vindos da cozinha num verdadeiro escarcéu aprontado pelo papagaio. Acomphado por amigos Neco adentrou a casa indo direto a cozinha La estava à velha Miquelina com um pacote de veneno na mão, se debatendo com um cão agarrado na barra de sua saia e o papagaio gritando: - segura bugre pega ela bugre... Assassina! Você é assassina bruxa velha! Pensa que me engana! Tai sinhô Neco essa bruxa não botou veneno na feijoada porque eu pedi para o bugre segurá-la! Essa malvada faz tempo que tenta incriminar a Pretinha invejosa... Duma figa! Tomou papuda ocê vai mofar na cadeia! Viu como é que o degas do loro é esperto to a te vigiar fás tempo! Desde o dia da comida que matou aquele montão de mosquitos... Agora te peguei sua bruxa desdentada!

Geraldinho do Engenho
Enviado por Geraldinho do Engenho em 28/02/2011
Código do texto: T2819446
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