As coleguinhas

As Coleguinhas

Em qualquer lugar, em qualquer tempo, uma pitada de realidade mesclando o nosso dia a dia com sal, pimenta e “querozene”

Um grupo de amigas cujas integrantes se tratavam e ainda hoje se tratam, mutuamente e carinhosamente por coleguinhas foi formado a partir de uma reunião simples, um almoço informal num determinado local, num tempo que não volta mais. Houve uma espécie de dispersão natural, pelo desgaste das relações, falecimentos, deslocamentos geográficos e algumas amizades que se degeneraram, mas as coleguinhas continuam unidas pelo mesmo propósito, mesmo que as tais formalidades tenham sido abandonadas pelos motivos expostos.

No inicio, não foi um acontecimento importante, mas hoje elas carregam na memória o poder de um sindicato, se bem que outrora já teriam sido uma espécie de Confederação. Exageros à parte, a toca das coleguinhas não tinha sede fixa, e essa rotatividade das reuniões dava um tom de insubordinação ou cheirava como o motim das falsas Amélias.

Essa alternância era a regra básica para que o grupo não se dissolvesse tão rapidamente e geralmente ocorria de uma forma sincronizada, no terreiro de cada um delas, ou às vezes, o grupo se fechava automaticamente quando em território pouco conhecido, como festas de aniversário ou casamento de amigos comuns. Algumas infiltrações pretensiosas eram observadas com um comportamento meio arredio, desconfiado e quase que preconceituoso. Aliás, bom que se diga, a sociedade inteira se comporta dessa maneira e a irmandade, era com certeza um espelho fiel com requintes de crueldade

Pela união e cumplicidade do grupo, quase que se poderia afirmar que implicitamente ele já existia e foi se consolidando a medida que cada integrante do grupo, começou a chamar uma pela outra, por coleguinha. Essa foi a palavra magia, uma espécie de grito de guerra e de paz, quase uma senha que insinuava uma cumplicidade estranha, mas não era definitivamente um complô contra o machismo, a não ser que sub-conscientes se comuniquem.

Aquelas que se aproximaram com o objetivo de se juntar ao grupo, mas se revelaram portadoras sintomáticas de parvoíces, ou mesmo parvulez ou pascacice, ou ainda molangueiras e sapitucas foram se auto-excluindo, mesmo porque não se admitia nesse clube social quem sofresse também de pseudofobia ou peruas por convicção ou ainda mogilalismo. Óbvio que existiam muitas candidatas fortes que poderiam entrar para o grupo, mas não se sabe se existia um regulamento interno implicito que permitisse um numero superior a cinco. Pronto, revelei um dado que me deixa fragilizado e algumas pessoas mais ligadas e atentas poderão identificar com precisão as componentes. Mas... coincidências e carapuças haverão de me ajudar nesse causo ou nesse caso.

Falava-se até que o regime interno era o mesmo da academia brasileira de letras, e uma nova integrante somente tomaria posse por morte ou por exclusão sumária vulgarmente chamada de expulsão, poderia ser convidada e mesmo assim olhe lá.

Mas não pensem que o objetivo foi filantrópico, de trabalhar para alguma comunidade carente em algum salão “paroquial” costurando roupinhas e agasalhos. Não pensem que elas tinham algum interesse por música, ou difusão cultural, política, dança, luta de karatê, música dos anos 60 e outros hábitos de humanas ou lobas comuns, etc. O objetivo foi, como continua sendo, é o de promover reuniões em fins de semana, onde os maridos jogam truco ou ficam ao redor da mesa de sinuca e elas, ficam por ali, paparicando os ditos cujos (ou vice versa), saboreando geladíssimas cervejas e falando da vidas dos outros, discutindo tecnologia nova de como lavar calcinhas no banheiro, depilar pernas, como se portar em festas com meias rasgadas, localizar fios de cabelos brancos traiçoeiros, trocar figurinhas, digo, bijouterias, o baton novo, administrar a TPM ou os excessos dos maridos, o estilo dos penteados, o aspecto do relacionamento com os filhos adolelescentes e aborrecentes, sogras, sogros, cunhadas e concunhadas enjodas, esnobes, e outras impropriedades indignas de serem citadas aqui.

Portanto, o clube tinha um sentido (ou tem ainda) fundamentado (eu não disse fundamentalista) e tinha como objetivo principal, o famoso boca de gole de fim de semana, dentro de uma filosofia “Irlimariana” que tem como lema: Se for pra morrer de batida, que seja de limão e vodcka. E quando presente em algum estabelecimento que sirva cerveja, lá pelas tantas, o grito de guerra era: “ Eêhhhhh, buteco.

Portanto, não existia um contrato, um documento firmado em cartório, dando um contorno de formalidade a esse grupo irriquieto, de transparência duvidosa.(tipo assim, se você que chegou agora, ou está distante há mais ou menos tres metros e perceber aquela gargalhada geral, não chegue perto e não pergunte porque pois nunca vai saber.

Existiam algumas outras amigas, tão amigas quanto as integrantes entre si, que já tentaram entrar para o grupo em vão. Elas usam do mesmo artifício, usam a mesma senha que é chamar pelo nome coleguinha, mas sem sucesso.

O grupo é fechado com cinco sócias gerentes, fugazes, determinadas, casadas e muito bem casadas, ou acasaladas tanto faz, mas com brilho próprio e óbvio, participando ativamente das reuniões como coadjuvantes, os seus respectivos maridos brucutús.

Se elas resolvessem se reunir, fizesse chuva, tivesse sol, chovesse canivete, mesmo que houvesse arrastão de pivetes em profusão, nada impediria.

Se houvesse um novo dilúvio, sem duvida elas reinventariam a arca que flutuaria sobre o Pico do Mendanha em Goiânia ou que flutuasse pelo Rio Piranga ao longo da Rasa em Ponte Nova, ou mesmo que tivesse que navegar no imundo Arruda de BH e então a arca se denominaria a Arca das Coleguinhas.

Elas monopolizavam o telefone, uma fazia feijão, a outra fazia farofa, outra vinha carregando a maionese, a outra fazia o lombo assado, outra esquecia, não trazia nada e quando a reunião seguinte era finalmente definida em que local, os preparativos da anfitriã, eram quase que solenes.

Depois de um certo tempo que a cerveja já havia rolado, começavam os gritinhos histéricos, as gargalhadas estrondosas, os cochichos e os devaneios e até, pasmem todos aqueles incautos, que chegavam por acidente no local, ou que ouviam dizer sobre tais reuniões, onde se mostrava até uma grande tendência para lições de estoicismo, saiam de perto, como se diz para não se comprometerem como testemunhas. Nem as crianças dormiam. Os gatos ficavam de olhos arregalados, os cachorros latindo o tempo todo tentando ganhar algum resto de comida. O papagaio quando aprendeu finalmente o nome de todas as integrantes, obviamente também já sabia falar alguns palavrões.

Foi quando então finalmente alguns legisladores afoitos, finalmente decretaram o fim desse fantástico clube da Luluzinha. Elas se esqueceram de que os bolinhas, eram serviçais para churrasco, manobristas de carro, mas quando lhes foi proposto o rigor da Lei, a casa caiu e o clube fechou.

Falam agora em reabri-lo de uma forma mais organizada e formal, tipo confraria. Vamos ver o que acontece e o que se vai poder oferecer aos amigos leitores.

Nomes serão preservados e aquilo que coincidir com algum fato real, será mera coincidencia.

Luiz Bento (Mostradanus)
Enviado por Luiz Bento (Mostradanus) em 08/06/2012
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