* Atendendo a pedido: um pouco mais de texto sobre o Livro "Jaliza - A Sacerdotisa de Amon-Rá"

Naquela manhã tudo era festa, em Tebas, sob o sol ardente do Egito.

Jaliza, a jovem cigana, tão logo se recuperou do incidente em que involuntariamente se envolvera, seguiu a passos lentos de volta à sua caravana, levando entre os seus finos dedos o lírio imaculado que lhe atirara o jovem sacerdote. Ia pensativa, caminhando como se ao seu redor não se desenrolasse uma festa tão exuberante e inusitada para ela, que pela primeira vez visitava o Egito.

Seus belos olhos estavam turvos por uma estranha emoção, desde o momento em que encontrara o olhar do sacerdote que lhe parecia ao mesmo tempo familiar e misterioso, provocando um vazio indescritível dentro do seu peito.

Neste estado de ânimo chegou Jaliza junto aos seus irmãos de raça.

_ Onde estiveste que a procuramos por toda a parte e não a encontramos no meio desta multidão festiva? – perguntou a Jaliza um cigano de porte altivo, aparentando seus vinte e poucos anos, cabelos e olhos escuros, mas a fisionomia não o deixava negar sua origem cigana.

_ Andei apreciando esta belíssima festa, estive até próximo ao cais observando passar o cortejo do Faraó e sua corte. Ramon, como este povo é diferente de todos os que já conhecemos; o luxo e o requinte em que vivem não são vulgares, parece que este povo não poderia mesmo ser diferente. Viste que lindas são as mulheres, com suas indumentárias coloridas e finíssimas, suas jóias de rara beleza?

_ Vejo que Tebas já te cativou pequena Jaliza, porém, cuidado, estamos em uma terra estranha, cheia de estranhos costumes, mesmo para nós ciganos. Onde arranjaste esta flor? – perguntou Ramon.

_ Ah! Quase esqueço de contar-te, minha aventura inusitada. Ganhei-a de um nobre que passava todo paramentado em sua vistosa liteira, quando imitando o gesto do povo, que atirava flores à passagem do cortejo, atirei a rosa que trazia nos cabelos e não hás de ver que um espinho feriu a testa do nobre, que após apanhar a rosa, devolveu-me um lírio que estava preso à sua liteira – contou Jaliza, prendendo o lírio aos cabelos num gesto de naturalidade.

Ramon, porém, notara que algo perturbava sua amiguinha tão querida, sem saber, entretanto, o que seria, continuou:

_ Jaliza, imagine se tiveste atingido o Faraó. O que aconteceria?

_ Oh! Não sei Ramon, Sabes que a multidão ficou em expectativa, como se alguma coisa de ruim pudesse advir daquele meu gesto. Mas já passou e perdi o interesse pela festa; estou faminta. Onde iremos acampar?

_ Já estamos acampados próximo às margens do Nilo, numa área que nos foi destinada pelos guardas da cidade, não fica muito longe da praça do mercado. Hoje, à noite, faremos uma festa, também, em homenagem ao rio sagrado; creio que o Faraó gostará de apreciar nossa festa do terraço do seu palácio.

_ Verdade? Então me diga Ramon, onde está Jasan, nosso chefe?

_ Creio que deve estar fazendo um reconhecimento da cidade, pois sempre que chegamos a alguma terra desconhecida, procura inteirar-se sobre os costumes, tudo, pois sabes como Jasan é correto em seu modo de dirigir a nossa tribo. Por isso, é que todos nós seguimos suas leis sem maiores problemas, porque elas nos parecem justas.

_ É verdade, tem sido sempre assim com o nosso grupo. Jasan é realmente um verdadeiro príncipe cigano. Sinto-me feliz em estar sob sua proteção. Mirca me disse que quando ela e minha mãe eram jovens, ambas estavam apaixonadas por Jasan, mas aí apareceu um nobre que se apaixonou por Luanda, minha mãe, e mesmo contra as ordens do rei de nossa tribo, Luanda encontrava-se com o nobre às escondidas, até que um dia, seduzida, fugiu com ele. Mas nosso rei Jefer, pai de Jasan, que era na época príncipe herdeiro, não se conformou com a fuga da bela cigana que traía toda a sua tribo por amor de um gajon, um nobre que não respeitava as nossas tradições e mandou um grupo de ciganos ao encalço dos fugitivos.

O casal foi alcançado, o nobre foi assassinado ali mesmo e Luanda foi levada de volta à sua tribo com as mãos amarradas e atadas a uma das carroças da caravana, que a levaria à presença do nosso impiedoso rei. Jefer não permitia que nenhum dos seus ciganos traísse as tradições de seu povo e não perdoou Luanda, a fez sofrer todas as humilhações diante de toda a sua tribo. Humilhada e infeliz Luanda faleceu pouco tempo depois de dar à luz a uma menina, que então foi criada por sua fiel amiga Mirka, já há este tempo, noiva de Jasan. Essa pobre criança sou eu.

Quando Jefer foi acometido pela enfermidade maligna que o levou, Jasan assumiu o seu lugar de direito e governou o nosso povo com mais sabedoria e benevolência que seu pai, porém, continuou firme nas tradições do nosso povo. E assim, Ramon, fui sempre criada por Mirka e Jasan, nosso chefe e esta história muitas vezes me foi narrada por ela, para que eu jamais me esqueça de que sou uma cigana, muito embora tenha tido por pai um nobre de outra raça.

Mirca diz que herdei os mesmos olhos de minha mãe e, também, a sua graça ao dançar. Diz que quando minha mãe dançava numa praça a cidade parava para vê-la bailar. Os nossos profetas avisaram, dizem, que Luanda, que conhecia os segredos da magia, não viveria muito tempo entre o seu povo e assim foi. Porém, disseram também que sua filha teria um estranho destino e eu tenho medo, Ramon. Os profetas nunca erram, mas Mirka e Jasan procuram afastar essas idéias, dizendo que os profetas não profetizaram nada de ruim para a filha de Luanda. Mesmo assim tenho medo.

_ Nada temas, pequena Jaliza, tudo isso que acabas de dizer-me todos nós da tribo sempre soubemos e sempre a amamos, nunca um membro desta tribo a olhou como a filha do nobre, todos a vêem como a filha de Luanda, a bela cigana que todos amavam.

_ É verdade Ramon, minha mãe era muito querida entre o nosso povo e todos sofreram com a sua fuga e com a pena imposta a ela pelas nossas leis. Não sei o que me deu, agora, para ficar falando-te sobre tudo isso, acho que, hoje, não estou muito bem. Sinto-me triste, sem saber por que e essa nostalgia fez-me relembrar os tristes acontecimentos que envolveram minha mãe e do qual sou o fruto. Mas que nos importa o passado? Vamos Ramon, tenho fome.

E dizendo isso, Jaliza puxou seu amigo Ramon pelo braço e saiu quase a correr em direção ao acampamento do seu povo.

_ Mirka, Mirka, tenho fome de leão e Ramon também.

_ Onde andaste menina travessa? Então, tens fome, hein!? Pensei que o calor do Egito e a beleza da festa tivessem tirado sua fome – dissera Mirka sorrindo, em tom de censura fingida.

_ Oh! Sinto muito querida Mirka, eu esqueci da hora e fiquei olhado a festa, depois encontrei Ramon e ficamos conversando. Ramon disse que haverá festa, hoje, na praça defronte ao palácio real.

_ É verdade, Jasan quer que prestemos uma honrosa homenagem ao Faraó, esta noite. Todos nós estaremos lá e como de costume encantaremos com nossa dança e nossos cantos.

Jaliza parecia ter-se esquecido do incidente da rosa e a tarde transcorreu serena nos preparativos para a festa da noite. Os homens afinavam seus violinos e as mulheres arrumavam seus mais belos trajes. Era a primeira vez que dançavam para um Faraó.

Arádia Raymon
Enviado por Arádia Raymon em 21/10/2009
Código do texto: T1879358
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