Sangue na parede

Maria de Jesus morou por muitos anos na antiga cidade de Pitangui em Minas Gerais, ouvia diariamente as histórias de crueldade contadas pelo povo pitanguiense a cerca de seus conterrâneos ilustres como Maria Tangará, Velho da Taipa, Joaquina de Pompeu, Borba Gato e outros. À noite, quando se recolhia, não conseguia dormir, por mais que tentasse, que relaxasse, que procurasse desanuviar os pensamentos na leitura de um bom livro, as imagens criadas por sua mente a respeito das histórias ouvidas, insistiam em aparecer.

A casa onde morava, uma antiga construção em telhas coloniais e piso de tábuas sobre um porão, contribuía para o seu suplicio. Os sons emitidos, tais como o estalar da velha madeira, o ranger do piso ao toque dos seus passos e o som das telhas se dilatando com o frio da geada, após um dia de grande calor, fazia seu corpo petrificar na cama onde permanecia deitada, a noite toda de olhos bem abertos. Estava desesperada. Aceitara se mudar para aquela cidade para satisfazer o marido que era historiador e que tinha ali, um vasto campo para suas pesquisas. O marido, ao seu lado, dormia tranquilamente. Ele também acreditava em todas as atrocidades ocorridas na sétima vila do ouro, mas compreendia que tudo havia ficado no passado e que não poderia tais acontecimentos exercer nenhum poder sobre os viventes de agora.

Certa vêz, Maria dissera ao marido sobre seus temores, ele rira, e dissera que tudo ficaria bem com o passar do tempo. Ledo engano. O tempo só fazia com que a mente de Maria enfraquecesse. Começou a ser torturada ainda mais pelos mistérios e fantasmas da sétima vila do ouro.

Em uma noite de grande tempestade, o som da chuva no telhado, o clarão dos relâmpagos logo acompanhados pelo ensurdecedor estrondo da trovoada, fez com que Maria não conseguisse permanecer deitada. Levantou-se e pos-se a perambular pela casa, estremecia a cada trovão. Por fim sentou-se em uma velha poltrona, tentou em vão adormecer, não conseguindo achou melhor ascender a luz e ler um pouco. Levantou-se, dirigiu-se ao interruptor, ascendeu a lâmpada. A luz amarelada e incandescente iluminou lentamente a sala, Maria, ao se virar não pode se conter, soltou um grande grito de horror, levou as mãos ao rosto, deixou-se desfalecer ao chão, as mãos cobrindo o rosto, os olhos fechados, retirou as mão e olhou novamente, novo grito, era uma visão horrível. As paredes da sala estavam todas manchadas de sangue. Era com se alguém gravemente ferido tivesse se apoiado a ela para poder caminhar pela sala. As manchas começavam em um ponto da sala e seguiam a até a porta de acesso a rua. Gritou desesperada pelo marido que meio sonolento e sem entender o que estava acontecendo, apareceu logo vindo em socorro. No dia seguinte, Maria deixou-se convencer que tudo fora fruto de sua imaginação, motivada pelas histórias ouvidas e pelo medo que sentiu durante a tempestade.

Algumas semanas depois, tendo o marido viajado para Mariana – MG, para estudar alguns documentos históricos e compará-los com as citações encontradas em velhos livros sobre a história de Pitangui, Maria voltou a ver novamente as manchas de sangue na parede. Agora não só na sala mas em todos os cômodos da casa. Não havia onde se esconder, não tinha para onde ir, nem para quem ligar.

O marido permaneceu quatro dias em Mariana. Ao regressar encontrou a casa toda fechada, depois de chamar repetidas vezes acabou por concluir que não havia ninguém em casa. Forçou a porta e não teve dificuldades para fazê-la ceder.

A visão foi aterradora. Maria estava no centro da sala. Os olhos enormes, a língua jazia pendente, estava pálida, seus pés suspensos a balançar, o corpo preso pelo pescoço a uma corda amarrada ao caibro central da casa.

A casa permaneceu vazia por anos. Diz a lenda que a manchas sempre aparecem, e todos os que vêem estas machas acabam morrendo de forma trágica.

Luciano de Assis
Enviado por Luciano de Assis em 12/09/2011
Código do texto: T3214634
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