O castelinho da rua Apá - Compilação

Pouco tempo antes de sua morte, no dia 23 de julho de 1988, ainda se podia ver a velha senhora a cuidar do túmulo do seu antigo amado. Ela era Maria Cândida Cunha Bueno, a Baby, dos seus tempos de jovem que, durante grande parte dos seus 97 anos, caminhou até o cemitério para homenagear a memória do seu namorado, autor para a polícia, e vítima para ela, de um crime batizado pelos jornais de "o crime do castelinho da rua Apa".

Ninguém sabe o que realmente aconteceu, na noite de 12 maio de 1937, dentro do castelinho até hoje existente, à rua Apa, esquina com avenida São João, bairro de Santa Cecília, São Paulo. Elza Lengfelder, cozinheira da rica família moradora do local, ocupava um anexo da residência, e a ouvir tiros no interior do castelinho, saiu às ruas para chamar um policial. Ao entrar na casa, o policial viu três corpos estendidos entre o escritório e a sala. Eram os irmãos Álvaro e Armando Reis, e sua mãe, Maria Cândida Guimarães dos Reis. Tratava-se de gente muito importante na cidade; no dia seguinte o caso ganhava as manchetes dos jornais, já sob o título de "o crime da rua Apa". Álvaro, advogado, esportista, de 45 anos, vivia cercado sempre de belas mulheres. De perfil bem mais discreto, Armando César dos Reis, também advogado, morreu aos 43 anos. Dona Maria Cândida dos Reis, de 73 anos, senhora dedicada à prática religiosa, enviuvara há dois meses do médico Vicente César dos Reis.

Sabia-se que Álvaro, depois de uma viagem à Europa, voltara entusiasmado com novos e arriscados projetos na cabeça. Com a família dona de um imóvel na avenida São João, 566, (hoje um prédio de apartamentos), que estava arrendado para o luxuoso cine Broadway, ele sonhava em construir no local um rinque de patinação. Armando se opunha a idéia. A polícia encontraria aí uma primeira pista para a sua versão do crime. Os desentendimentos entre os irmão levara Álvaro a matar Armando e a mãe de ambos para suicidar-se em seguida.

Perto dos corpos foi encontrada uma pistola Mauser, calibre 9mm, de fabricação alemã. Registrada em nome de Álvaro, a arma só veio reforçar a hipótese da polícia.

Havia uma circunstância que atrapalhava a tese: Álvaro fôra morto com dois tiros, fato pouco comum no caso de suicídio. As investigações posteriores, com a descoberta de promissórias assinadas pôr Álvaro, entretanto, levaram a polícia a dar por concluído o caso, apontando-o definitivamente como o autor dos disparos.

Amigos de Alvaro, no intuito de preservar sua imagem, encarregaram-se de uma versão mais amena. Ele apenas empunhara a arma, talvez, sem mesmo pretender usá-la contra Armando. A apavorada mãe, ao tentar separar os filhos, fizera-o acionar o gatilho, provocando também sua própria morte. Diante da acontecido, Álvaro não teria cogitado de outra alternativa, senão o suicídio.

Para dona Baby, nenhuma das duas hipóteses correspondia aos fatos. Armando, ela tinha certeza, era o verdadeiro vilão da história. Dona Baby morreu defendendo a inocência de Álvaro. Levada para uma casa de repouso, devido a uma fratura na bacia,, ocasionada por queda, ela pediu a um parente que continuasse a cuidar do túmulo de Álvaro, após a sua morte.

Conta-se que o crime foi motivado pelo desejo de posse do imóvel ou do dinheiro obtido com a venda do mesmo. Não tendo o crime sido desvendado, os espíritos vagam pelo castelinho, um preso a cobiça e o outro a espera pela justiça, para que sua alma possa enfim, gozar do descanso eterno.

Há quem afirme que em altas horas da noite é possível ouvir gritos em seu interior clamando pela libertação de seus espectros, presos a tragédia do “Castelinho da rua Apá” a mais de setenta anos.

*Apenas mais uma versáo das milhares existentes a respeito deste monumento da história trágica do Brasil.

Luciano de Assis
Enviado por Luciano de Assis em 15/09/2011
Reeditado em 15/09/2011
Código do texto: T3220564
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