Rever Amigos

"Revendo Amigos

Vontade de rever amigos

Os gestos de sempre, a risada em comum

Contando as histórias e os casos antigos

As músicas novas sem moda, sem tempo nenhum

Vontade de rever amigos

Dizer que estou solta na minha prisão

Gritar pras pessoas

Vem cá que eu tô viva

Me tira a tristeza de dentro do meu coração

Saber quem morreu

Perguntar quem chegou de viagem

Se foi porque quis

Explicar que o amor me pegou de mal jeito

Mas tudo somado acho que fui feliz

No entanto, cadê meus amigos

Vai ver que a poeira do tempo levou

A barra da vida tem muitos perigos

E a gente se afasta sem querer

Se esquece sem querer

Se perde dos velhos amigos

Se esquece e se perde dos velhos amigos"

(Joyce)

Neste sábado, almocei com amigos.

Amigos tão queridos que merecem ter sua identidade revelada: Billy, Maurinho, Pepê e Babalu. Os dois primeiros acompanhados por esposas, filhos e até um netinho, um tanto prematuro, mas muito lindo.

Foi um encontro festivo: estávamos comemorando o único dia 31 de janeiro de todo este ano. Uma ocasião mais do que especial para nós, que jamais precisamos de motivo especial para celebrar nossa amizade. Esta já é especial o bastante para merecer toda e qualquer celebração. E sempre foi assim. Quantas vezes inauguramos o Líbanus (bar e restaurante, famoso pela cerveja mais gelada da capital federal, com mais de vinte anos de tradição na cidade)?

A turma é maior: CW, KCT, Carlão, Neto, Gazela, Victinho, Ricardo, Regina, Cristina, Macro, Moita, Roque... Mas, neste sábado, ficou reduzida a este pequeno grupo. Isto não nos impediu de passarmos horas muito agradáveis, contando piadas, lembrando canções e, principalmente, revivendo nossas experiências de anos atrás...

Lembrar o dia em que o Pepê, que nunca bebe, tomou uma cervejinha e acabou ficando bêbado. E, quando digo uma, foi uma mesmo. Foi o que bastou para alcoolizá-lo. Apesar das insistências contrárias, resolveu ir dirigindo até em casa. Ele se lembra de poucas coisas do caminho. Uma delas é de ter parado num posto de combustível e perguntado ao frentista:

- Moço, onde é que eu moro?

Fez o trajeto de cerca de trinta minutos em aproximadamente quatro horas e chegou com o carro cheio de lama. Chegou, em parte. Largou o carro na entrada do condomínio e caminhou os quinhentos metros restantes até sua casa.

Numa outra vez em que ele bebeu, escreveram seu endereço num cartão e colocaram em seu bolso, enfiando-o em um táxi, em seguida.

Maurinho nos lembrou da viagem que fizemos a Caldas Novas em meu Niva, eu, o marido, ele e a Elaine, sua esposa na época. Levamos as bicicletas com as quais pretendíamos rodar do camping onde nos encontrávamos até a cidade. Eram somente uns oito quilômetros, seis dos quais, de terra. Na ida, tudo certo. Quando chegou à cidade, porém, ela disse que não queria voltar pedalando, por nada deste mundo. Tentamos encontrar alguém que aceitasse nos levar de volta, mas taxista nenhum aceitou transportar as magrelas empoeiradas. No caminho de volta, ela já vinha resmungando, quando um carro passou por nós, levantando uma tonelada de poeira. Ela "apeou", furiosa. Gritava, dramática:

- Eu quero morrer, mas eu não dou mais uma pedalada.

Conseguimos fazê-la mudar de idéia, mas as bicicletas não saíram mais do camping.

Maurinho, o jovem, conquistou este título porque, já beirando os quarenta anos, só queria ser o garotão. Uma vez, tirando onda com o seu Kadet branco conversível, um carrão, na época, parou ao lado de um Escort com duas garotas, apenas para ouvir uma delas avisar à outra, decepcionada:

- Ih! É veeeelho!

Billy é negro, alto e forte. É doce como uma criança, mas impõe respeito, pela aparência séria e o vozeirão. Uma vez, sentamos num barzinho onde tocava a pior seleção musical possível: breaks, hip-hops, funks. Ele chamou o garçom e perguntou:

- Vem cá, meu amigo... aqui não toca música de branco, não?

O rapaz entendeu a piada, mas deve ter achado melhor levar a sério e foi procurar uma MPB para a gente ouvir.

Babalu é uma figura. Quando nos conhecemos, tinha mania de aumentar a idade, só para ouvir elogios sobre o quanto ela estava conservada. Não a víamos há tempos e aproveitamos o reencontro mais para saber de sua vida neste intervalo do que reviver reminiscências.

É uma turma que bebe direitinho, como gente grande. Por isso, tenho medo de prolongar muito nossos encontros. Não tenho mais a saúde para acompanhá-los. Lembramos de uma feijoada anos atrás. O restaurante controlava o consumo de chope colocando um pires na mesa a cada copo pedido. Somente quando já havia um muro de Berlim feito de pratinhos sobre a mesa é que decidimos nos servir. O buffet já estava nas últimas. Bêbados e com fome, encerramos a noite num bar onde o uísque estava em promoção. Se, hoje, eu repetir uma aventura dessas, vou passar o dia seguinte num hospital, tomando glicose, Buscopan e Plasil na veia.

Porém, mesmo correndo este risco, não abro mão de rever meus amigos.

É sempre um programa impagável, inesquecível, que renderá histórias e recordações para os próximos.

Aliás, estive olhando o calendário e, pasmem! Descobri que, neste ano, só tem um dia primeiro de março. E, veja a coincidência: vai cair num sábado.

É ou não é um bom motivo para celebrar nossa amizade?