Natal Não É Dia de Morrer


Véspera de natal. Depois de trabalhar pela manhã e passar a tarde na casa da namorada, José Roberto voltava para casa quando foi surpreendido pela chuva.
Lamentou não ter ainda reposto a viseira do capacete. Os pingos batiam com força em seu rosto, machucando a pele e os olhos. Encostou a moto numa parada de ônibus para esperar uma trégua de São Pedro. Três sujeitos aproximaram-se como se fossem pedir informações mas o que fizeram foi sacar uma 22 e alvejá-lo no abdômen, sem qualquer aviso. Enquanto estava caído, pegaram em seu bolso a carteira e tiraram o que havia de dinheiro. Ele olhava os documentos espalhados e pensava: tenho que recolher logo essas porcarias... se eu sair dessa, vai dar um trabalhão tirar tudo de novo.
E foi o que fez, tão logo os assaltantes saíram. Em seguida tentou conseguir ajuda, abordando as pessoas que encontrava na rua. Porém, ao vê-lo sujo de lama e sangue, andando meio encurvado, ninguém tinha coragem de se aproximar.
Já sentindo-se desfalecer, viu se aproximarem dois moleques da favela próxima. Teve medo, mas, sem alternativa, apenas os esperou chegarem perto. Os meninos o ajudaram a empurrar a moto até um posto policial, onde conseguiu, finalmente ser conduzido a um hospital.
Chegando lá, foi largado numa maca no corredor, sem qualquer atendimento.
Enquanto isso, a família começava a se preocupar com sua demora, pois ele era um rapaz muito responsável, não costumava atrasar-se sem aviso. Ninguém foi à Missa do Galo e a ceia esfriava sobre a mesa enquanto os irmãos tentavam acalmar a mãe. Sem telefone em casa, o pai incomodava vizinhos tentando ligar para qualquer um que pudesse ter notícias do garoto.
Só de madrugada a dona Margarida veio avisá-los.
José Roberto, depois de passar quase toda a noite jogado a um canto, baleado, molhado, sujo, com frio e fome, finalmente, havia conseguido que a acompanhante de um outro paciente do hospital, fizesse a ligação para a vizinha.
A família correu ao seu encontro. Providenciaram a transferência para um hospital conveniado onde ele foi operado. A bala já tentava entrar no coração, depois de passar horas passeando por seu sistema sangüíneo. Enquanto lutava pela vida, implorando por ajuda e atenção, inevitável lembrar-se do santo que lhe deu o nome. Naquela mesma noite, dois mil anos atrás, também São José havia batido de porta em porta com a esposa grávida até conseguir abrigo na manjedoura onde Jesus nasceu.

Imagem daqui.