CAPÍTULO IV - Diário Poético-Sentimental de Uma Greve: Curiosidades, Emoções e Poesia na Greve do Judiciário Trabalhista Mineiro

IV

Na primeira noite eles se aproximam: colhem uma Flor do nosso jardim e não dizemos nada. Na segunda noite, Já não se escondem: pisam as flores, matam o nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua e, conhecendo o nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E porque não dissemos nada, já não podemos dizer nada

(Eduardo Alves da Costa)

Antes da atual greve, os servidores do Judiciário Federal já haviam feito outras três. Em todas elas o objetivo mais atraente fora certamente a aprovação de um Plano de Cargos e Salários (PCS) para a categoria. Na atual greve, entretanto, temos também como importante fonte de motivação a oposição ao projeto do Governo que busca congelar os salários de todos os servidores do país - municipais, estaduais e federais - por cerca de dez longos anos.

O primeiro movimento de greve aconteceu no ano de 1996, o segundo em 2002 e o terceiro em 2006, sendo que eu havia participado dos dois últimos movimentos.

Sempre que me recordo do movimento de 2002, ressurge de imediato uma cena na minha memória: a ex-presidenta do sindicato - e uma das suas atuais diretoras de base - a colega Lúcia Bernardes saía percorrendo as Varas do Trabalho localizadas no prédio da Rua Goitacases com o objetivo de nos chamar para a greve.

Naquele dia ela dissera algo que havia resolvido definitivamente em minha cabeça a difícil questão da minha participação pessoal na greve. Propusera a ex-presidenta o seguinte problema para nós, servidores da 5ª. Vara do Trabalho: a qual criança uma enfermeira se dirigirá primeiro ao entrar no berçário de um hospital? Qual delas chamará a sua atenção e receberá os cuidados iniciais?

Resposta: a enfermeira dará sua atenção inicialmente para a criança que estiver chorando, esperneando e pondo a “boca no mundo”.

Algumas das finalidades de uma greve são exatamente essas: atrair a atenção da sociedade, buscar a aceitação da população e objetivar a abertura de negociação.

O que a ex-presidenta quis dizer naquela ocasião é que se nos dispusermos calados e quietos como as vaquinhas e os burrinhos de presépio desse ou de qualquer outro mundo, ninguém nos ouvirá e o bonde da história com certeza passará sobre nós sem sequer se aperceber que um dia existimos.

Nas condições descritas anteriormente, a enfermeira entrará no berçário e não dará a mínima importância para aquele amontoado de bebês silenciosos e bonzinhos. Agora - e por outro lado - experimentemos abrir a boca e por as nossas cordas vocais e os nossos pulmões cheios de vida para funcionar que vocês vão ver: todos imediatamente perceberão a nossa presença e o nosso grito não terá sido em vão.

Luís Antônio Matias Soares
Enviado por Luís Antônio Matias Soares em 07/08/2010
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