Sobre a paralisação dos médicos no Rio de Janeiro:


Não há consenso em torno de objetivo único que deveria ser uma opção mais justa para o médico assistente (honorários) e para o paciente (preço pago pelo serviço de saúde).

Esses são os dois lados da moeda sobre os quais incidem (sempre) todos os efeitos negativos dos serviços de saúde, quaisquer que sejam as decisões tomadas em função e a partir dessas paralisações e movimentos de classe.

 
A intermediação de qualquer serviço é (quase) sempre indesejável. Especialmente nos moldes que vemos por aqui. Mas uma vez que é inevitável, que nós médicos nos unamos e validemos uma proposta a ser aprovada e integralmente honrada por todos nós. Por nós me refiro à grande maioria que quer melhorar a assistência médica prestada ao usuário dos planos de saúde, mantendo o padrão técnico e a humanidade tão necessários.

A não concordância e a conseqüente não obediência às iniciativas propostas pelos órgãos de classe (e no caso dos oftalmologistas a COESO também) põe em risco a eficiência dos mecanismos legais usados para reivindicação, quaisquer que sejam eles. As propostas têm que ser discutidas amplamente, votadas e o que quer que venha a ser colocado em prática (desde que votado pela maioria) deve ser respeitado e acatado por todos. Mesmo aqueles que não estiveram presentes quando da discussão das medidas a serem tomadas. Esses tiveram a oportunidade de se manifestar estando presentes às reuniões que deram origem às propostas discutidas e votadas. Não ter estado presente quando da convocação significa aceitar o que foi votado e acatar (no caso) a paralisação.

 
Democracia é o que historicamente temos vivenciado e nos foi cara a volta a ela após os anos de ditadura. Saibamos exercê-la e honremos a nossa opção.
 
E que a união faça a força e consigamos estabelecer uma relação de maior equilíbrio e respeito mútuo (médicos e intermediadoras de serviços de saúde). A preocupação constante com a qualidade técnica dos serviços prestados em saúde aliada à busca cada vez maior da humanização do atendimento médico devem fazer parte do nosso compromisso. E somados à satisfação do trabalho reconhecido através da contemplação justa dos honorários, com certeza nos tornarão alvos menos freqüentes da insatisfação crônica do individuo comum para com o “sistema de saúde”.
 
Algum (pouco) tempo atrás um movimento médico perguntava “quanto vale o médico?”. O que tenho lido nas críticas do individuo doente e de seus familiares dirigidas aos médicos e às unidades de saúde indicam que ele deveria valer menos do que vale hoje. Nos chamam de “máfia de branco”. Aonde chegamos? O que deu errado? O que deixamos de ver?

Qualidade e preço. Preço e qualidade. Duas variáveis que nos acostumamos a pensar sempre como condição uma da outra. A pouca qualidade atribuida (pelo usuário) à maioria dos serviços de saúde é causa ou consequencia dos valores praticados pela Medicina de Grupo ou pelos planos de saúde? A resposta ideal não deveria contemplar nenhuma das duas opções.
Mas, ao mesmo tempo que lutamos por honorários mais justos deveríamos garantir ao assistido uma Medicina de melhor qualidade. Não mais tecnológica, mas sim mais voltada para o bem estar do individuo e a satisfação da sua necessidade mais básica enquanto doente: respeito, alivio imediato do sofrimento e o conforto de se sentir ouvido e perceber interesse real por por parte do médico que o assiste.
Sem a necessária humanização da Medicina não teremos o apoio daquele que mantém o sistema de saúde (cooperativas, convênios e planos de saude). E, em ultima análise, não teremos como fazer valer nossas reivindicações. A quem interessará a nossa causa?

Quem nos apoiará? Apenas os órgãos de classe? Quem paga pelo sistema, pelo produto (saúde) é o usuário. E se ele está insatisfeito não temos poder de barganha. Dito assim soa mal. Mas na verdade é disso que estamos falando. Não é o que se diz por ai para justificar baixos salários? “Finge que paga...eu finjo que trabalho”. Essa é uma forma perversa de pensar. Faz mal ao cliente, mas antes de tudo, faz mal ao próprio médico, desvirtuada que se torna a sua profissão.

Não é à toa que se fala em vocação para professores, médicos e religiosos. Existe um quê de entrega que funciona como pré-requisito para essas funções. Sim, todos precisamos sobreviver. Mais do que isso, precisamos e lutamos todos pelo conforto que os bens de consumo nos permitem. Mas a conciliação é possível quando a ambição não é desenfreada.

Podemos trabalhar muito melhor que hoje, podemos ajudar a elevar os índices de saúde e qualidade de vida entre nós, se cada um fizer a sua parte. Muito bem feita. O melhor que puder, sempre. Lutemos pela qualidade na Saúde e estaremos legislando em causa própria.

Voltaremos a ter o respeito do paciente, de sua família, de todos em nosso entorno. Mais do que isso e principalmente, voltaremos a ter orgulho de ser médicos!