A respeito do texto “Saúde, a angústia da impotência” publicado aqui , uma leitora comentou “... por diversas vezes senti ímpeto de despejar em você todo o meu descontentamento em relação à sua classe profissional”.

Mais adiante ela disse “... em todas as profissões há os bons e os maus profissionais. E pior que bons ou maus, há a desinformação, que os nivela por baixo. Faço votos que a sua voz seja ouvida por muitos”.

Um outro leitor disse: “... Infelizmente opino que o problema esteja puramente no desgoverno da máquina estatal de saúde. Constroem-se estádios e investem-se bilhões na realização de uma Olimpíada e Copa do Mundo. R$:60 bilhões para ser mais exato. Vão-se construir estádios, investir em hotéis, infraestrutura aeroportuária. Porém,escritora e leitores, quantos grandes hospitais, com equipamentos de última geração, médicos, enfermeiras e auxiliares enfermagem/administrativos os senhores viram construir nas capitais de seus estados nos últimos 20 anos? Temo que a resposta seja nenhum, e os que já existem estão simplesmente deteriorados. “Os responsáveis pela saúde, quer no âmbito federal, estadual ou municipal, empurram a solução do problema uns aos outros. Não creio que nos próximos 20 anos mude qualquer coisa”.

Comentando as observações deles, percebi a necessidade de dividir com vocês o que penso a respeito do que foi dito.

 Torço para o meu amigo estar errado e o cenário na área da Saúde ser bem diferente daqui a 20 anos.Apesar de não ser tão otimista quanto gostaria, espero ver mudanças num prazo não muito longo.Depende ,na minha opinião mais de nós, médicos e assistidos, do que das autoridades e políticos.
Durante uma época eu era voluntária numa instituição de caridade e via, semana após semana, os mesmo doentes voltarem com as mesmas queixas, mesmo tendo sido orientados quanto à prevenção.Um exemplo: a uma mulher asmática foi dado um nebulizador, sapatos novos, roupa aflanelada e medicamento para modular a imunidade em dias de excessiva umidade e mudanças bruscas de temperatura (gatilhos costumeiros das suas crises de asma). Em vão... ela sempre voltava, com os mesmos sintomas, pés descalços na chuva,querendo remédios. Ficava calada quando falávamos sobre o nebulizador...quando perguntávamos porque ela estava de sandálias na chuva...será que vendia o que ganhava?

Miséria, doença... equação difícil de se resolver. Mais fácil "dar ópio ao povo" (diversão, estádios, jogos de futebol, olimpíadas) para anestesiar a dor... Resolver a miséria é utópico! Mais ainda se depende da decisão de poucos, entre quatro paredes, dentro de gabinetes e sem se apoiar em segmento comunitário que represente os interesses e necessidades urgentes da maioria. Mas... otimismo é a palavra de ordem.

Vamos torcer!
 
Mas que nossa conduta não seja meramente expectante...

E não tem sido expectante a conduta  de muitos de nós que no dia a dia tentamos apagar incêndios nas muitas florestas urbanas habitadas por centenas de indivíduos em dor, em sofrimento (por si ou pelos seus). Como o beija-flor que acredita ajudar a apagar incêndios com a água que traz em seu bico. Ele faz a sua parte, pelo menos. Como tenho dito, não é a Medicina que precisa de humanização, apenas.

Fomos nós, homens e mulheres que nos esquecemos de olhar à nossa volta e continuamos cada vez mais percebendo apenas o nosso umbigo. O Brasil não precisa apenas de médicos mais solidários. Precisa de brasileiros que se preocupem mais com brasileiros e que busquem juntos soluções para as questões mais urgentes. Mas concordo com todos vocês descontentes com o cenário médico de hoje: algumas profissões são mais do que apenas “profissão” porque lidam com necessidades básicas de todos nós.

Medo, sofrimento, angústia... as dores do mundo.Nós que lidamos com elas mais de perto, profissionais de saúde (física e mental) que somos, não deveríamos estar “anestesiados” como estamos.

Mas somos tão humanos quanto vocês, leigos. Vamos mudando aqui e ali, a passos menos largos do que o necessário é verdade. Mas sabemos a direção a seguir, pelo menos. Sabemos “o que” e intuímos “como” fazer diferença. E devemos ser os artífices desta mudança, é certo.
 
Mas precisamos de toda ajuda possível. E ela deve vir de todos, mas em especial daqueles que já viveram de perto a situação caótica da saúde entre nós.

Dizem que sempre aprendemos o que é preciso... seja no amor ou na dor. Que não precisemos de mais dor para nos ajudarmos, uns aos outros, a fazer o que é preciso para viver com mais dignidade a condição humana de todos nós.

Vamos nos ajudar e aprender, uns com os outros, como sair desta situação que nunca desejamos, mas para a qual todos nós contribuímos de uma forma ou de outra!