O meu lugar

Sou carioca de nascimento, mas, antes de completar um ano, vim para esta cidade. Seu nome é Valença, e foi intitulada a Princesa da Serra por D. Pedro II, quando passou por aqui em uma de suas viagens. Cidade de muitas belezas naturais, cercada de verdes montanhas, cortada pelo rio Paraíba do Sul (no Distrito de Barão de Juparanã), e com uma história rica por ter feito parte do Ciclo do Café, Valença é um pequeno paraíso, onde ainda se pode desfrutar de muitas áreas verdes e de certa tranquilidade, se comparada ao caos das grandes cidades.

Com sua localização privilegiada, distante do Rio de Janeiro em apenas 150 Km, e próxima à cidades importantes do sul fluminense como Volta Redonda, Barra Mansa e Resende, e de Juiz de Fora em Minas Gerais, Valença goza da vantagem de manter sua calma interiorana, mas conectada à modernidade das cidades mais desenvolvidas. Também apresenta um clima agradável e, embora seja uma cidade serrana, o inverno não é tão rigoroso como em outras localidades como, por exemplo, Teresópolis e Nova Friburgo.

Nós, os valencianos (no meu caso, de coração), já tivemos grandes momentos em nossa história. No início, a cafeicultura era a principal atividade econômica. “A produção cafeeira transformou Valença em uma das cidades mais importantes do Vale do Paraíba fluminense no século XIX. O crescimento era de tal porte que, em 1871, foi inaugurado o primeiro ramal ferroviário da Cia. União Valenciana para facilitar o escoamento da produção e consolidava a cidade em uma das mais importantes da província, com grande comércio e casas importantes. A opulência econômica traduziu-se na própria paisagem urbana. O arquiteto francês Glaziou projetou os jardins do centro da cidade, além de outros em fazendas dos homens mais ricos da terra.” (1)

 No começo do século XX, mais precisamente em 1906, foi criada a primeira fábrica de tecidos da cidade, pelo Grupo Ferreira Guimarães e, a partir daí, vieram outras, tanto do setor têxtil como de outros setores. “A chegada da indústria foi uma alternativa econômica para a cidade após a decadência do café. O deslocamento da produção cafeeira do Vale fluminense para o Oeste Paulista” (2), fez nascer uma nova vocação em nossa cidade – a vocação industrial. Nossa indústria têxtil tornou-se forte. Fomos, durante décadas, grandes produtores de tecidos, inclusive para exportação, além de produtos alimentícios, principalmente no setor de laticínios. Entretanto, a indústria têxtil brasileira começou a entrar em crise a partir da década de 1980 devido a inúmeros fatores, com isso, fábricas foram sendo fechadas pelo país inteiro e com Valença não poderia ser diferente: nosso complexo industrial foi acabando pouco a pouco, deixando milhares de desempregados. Tempos difíceis, muito difíceis.

No final da década de 1960, Valença passou a investir na educação de nível superior e, com a criação da Fundação Educacional Dom André Arcoverde (FAA), foram instituídos diversos cursos: Direito, Medicina, Filosofia, Ciências e Letras, Odontologia e Economia. A cidade foi a pioneira entre as cidades vizinhas na implantação de faculdades e, por isso, foi chamada de a Cidade Universitária. Esse acontecimento foi muito importante para o aquecimento da economia local, uma vez que recebia estudantes de muitos lugares do Brasil que precisavam morar na cidade para poder estudar, portanto, precisavam consumir. Vários setores foram beneficiados: do comércio, de imóveis, de serviços. Isso favoreceu também a geração de empregos, não só nos setores que se viram obrigados a contratar para atender a demanda, mas na própria Fundação, que passou a ser a maior empregadora da cidade, distribuindo mão-de-obra por todas as Instituições de seu quadro. Hoje, a FAA ainda emprega grande parte da população e oferece novos cursos como Medicina Veterinária, Enfermagem e Análise de Sistemas.

Quanto ao aspecto político, prefiro não me estender muito. Até porque o que ocorre em minha cidade é o mesmo que ocorre em milhares de cidades do interior do Brasil: o poder nas mãos dos mesmos grupos políticos há gerações. Como dizia um candidato nas últimas eleições: “Quando não são os mesmos nomes, são os mesmos sobrenomes.” Dá para se ter uma ideia de como é a política por aqui.

Falando de coisas mais amenas e bonitas, nossa cidade é rica em cultura. Aqui existem grandes artistas da música, da literatura, das artes plásticas, do artesanato, do folclore. Embora quase não recebam incentivo do poder público, os artistas estão sempre promovendo os mais diversos eventos. Seja na sede do município ou nos Distritos, há sempre algo bonito acontecendo. Conservatória, um de nossos Distritos, também denominada a Cidade da Seresta, é conhecida no Brasil inteiro por seu costume cancioneiro. Lá, todas as casas têm em sua fachada uma placa com título de canções, e os seresteiros percorrem as ruas com seus violões interpretando grandes clássicos da música popular arrastando as pessoas em procissão, as quais fazem coro com eles. É um atrativo para turistas que vêm das grandes cidades como o Rio de Janeiro, São Paulo e outras mais. Existem hotéis e pousadas de qualidade que todos os finais de semana ficam lotados. O artesanato local é admirável e a comida de seus restaurantes é muito saborosa. Conservatória também costuma receber artistas do cinema para o festival anual, promove eventos diversos seja na Gastronomia (o festival de queijos e vinhos é tradicional), seja na área musical. Isso tudo sem falar nas belas cachoeiras em torno da cidade, nas trilhas ecológicas, na paisagem bucólica que reporta aos antigos tempos, no casario, enfim, é um pequeno lugar, mas com grandes atrações.

Nosso povo é trabalhador, mas também é muito festeiro. Comemora com entusiasmo todos os seus Santos: Nossa Senhora da Glória (A Padroeira), Nossa Senhora de Aparecida, São Sebastião, Santo Antônio, São Jorge (a procissão reúne centenas de cavaleiros todos os anos), São Pedro. Mantém a tradição das Folias de Reis e em todo dia 6 de janeiro promove um grande encontro de folias em frente à Catedral de Nossa Senhora da Glória para reverenciar o Menino Jesus em seu lindo Presépio. Ah, e também temos um ótimo Carnaval, com desfile de Escolas de Samba e Blocos, com Bailes Populares no centro da cidade e nos Distritos, e Bailes nos Clubes Sociais.

Teria muito mais a dizer, muito mais a contar sobre esse lugar, o meu lugar. Essa cidade que, apesar de todos os seus problemas, ainda é um lugar em que se pode andar nas ruas sem sobressaltos, ainda se cultiva a paz e a harmonia entre seus cidadãos, ainda preserva suas tradições e costumes, ainda mantém a alegria e a esperança de um futuro promissor para seus filhos. Valença continua sendo a nossa Princesinha da Serra, embora os tempos de glória tenham ficado no passado.
      
 
 
 
 
Nota: (1) e (2), trechos reproduzidos do texto “Tecendo poderes: A industrialização em Valença, RJ (1880-1920)” de autoria de José Ricardo Ferraz (valenciano), para o
Mestrado da UERJ.     
 
 
Jorgenete Pereira Coelho
Enviado por Jorgenete Pereira Coelho em 11/10/2012
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