OS MORTOS DE RUBEM BRAGA

Na crônica “Os que vieram morrer no outono”, Rubem Braga relata que “O mal de um cronista idoso é a sua tendência de só falar de mortos”.

Corria maio de 1990 e Braga pôs-se a falar dos seus “mortos particulares”, que haviam partido naquele outono: Waldemar Bombonati, “cuja risada era fácil”, Elizete Cardoso, que certa vez insistira para que ele ficasse para um jantar feito por ela, dizendo-lhe: “Olha, Rubem, eu sou cantora porque isso dá mais, e o pessoal não reconhece o valor de uma artista da cozinha, mas minha vocação mesmo era para prendas domésticas...”, e do fenomenal editor José Olympio, seu amigo de mais de 50 anos.

Olympio era conhecido e querido em todo o Brasil, mas particularmente no Nordeste, porque a sua Casa editava os grandes nomes da literatura nordestina, como José Lins do Rego, Rachel de Queiroz, Graciliano Ramos, Gilberto Freyre, José Américo de Almeida e outros.

A propósito, Fernando Paixão assegura que “O sucesso inicial veio com a obra de Humberto de Campos, logo seguida do êxito alcançado pelos "romancistas do Nordeste". Já Eliezer Moreira chama José Olympio de o “...impulsionador da literatura de alta qualidade então produzida no nordeste do país.”

Mas o que eu estava falando era dos mortos de Rubem Braga, que se foram no outono de 1990, quando ele então estava com 77 anos. Pois bem, essa crônica foi uma espécie de prefácio da sua morte, porque no dia 19 de dezembro de 1990, final da primavera, deixou-nos Rubem Braga, um dos melhores cronistas do Brasil.

E para não dizer que eu só falei de morte, falarei de negócios, que é algo que mexe tanto com as pessoas. Rubem Braga pensava em estabelecer uma editora, juntamente com Fernando Sabino, e fora tomar conselho a José Olympio, um sucesso no quesito, um sujeito que, tendo a intenção de estudar Direito frustrada, começou a vida como ‘desempacotador’ de livros na Casa Garroaux, em São Paulo, em 1918,e se transformara no editor mais influente do Brasil em apenas uma década e meia depois. Em princípio Olympio dissera que os dois tinham “...tudo para sair bem da empreitada.” E como Braga insistisse em conselhos, o editor escreveu algo numa folha de papel, dobrou-a e entregou a Braga. Quando o mesmo a abriu, estava escrito: “Cuidado”.

Braga diz que, “Pena que ele próprio nem sempre pode seguir esse conselho: era um editor de coragem e instinto, ousado e generoso.”

De fato, José Olympio deveria ser muito generoso. Sabe-se que a compra da Editora Sabiá, de Rubem Braga e Fernando Sabino, por José Olympio, foi de certa forma um peso para o declínio da festejada Casa, associada à concorrência da Civilização Brasileira e o risco do investimento no ramo dos livros didáticos.

Não queria, mas findei falando em morte. A morte da Casa José Olympio, quando foi incorporada pelo BNDS, em 1974, e posteriormente vendida e descaracterizada.

O meu grande sonho de adolescente leitor era um dia poder publicar pela Casa José Olympio.