Pérolas de meus netos Cecilia e Arthur: Quarto Ato

 

       O que tenho para o momento, são duas crianças muito espertas que desfrutam a vida com bastante intensidade. As suas falas e saídas para tudo com que se deparam é deveras divertido. Evidentemente têm as birras, choros, atritos de irmãos e as tentativas de terem o que querem usando algumas armas inimagináveis. Em compensação têm também muitos abraços, beijos e risos.

       Deixemos as bajulações de lado, vamos tentar passar alguns momentos para a escrita. Indo para a escolinha com a dupla, de bicicleta com cadeirinha frontal e bike triller (carrocinha rebocada por bicicleta), digo aos netinhos: 

       _ O Vovô vai ser o cavalo que puxa a carroça. A Cecilia vai na carrocinha e o Arthur vai ser o cocheiro? Cecilia logo pergunta:

       _ O que é cocheiro vovô?

       _ A pessoa que conduz os cavalos e a carroça.

       Mal termino de responder e a Cecilia logo vem com suas ponderações:

       _ Vovô, eu vou ser a princesa e vou na carruagem atrás. Você não é cavalo, é o unicórnio que puxa a carruagem. O Tutu (Arthur) pode ser o cocheiro que vai na frente, tá bom vovôôô!

     Assim, acabo de ser promovido a Unicórnio e partimos em direção a escolinha a todo galope. Algum avô já recebeu alguma honraria ou condecoração maior que essa? Me sinto um verdadeiro puro sangue, e como sabem, unicórnio que se preze tem de voar! 

       _ Crianças, apertem os cintos e confiram os capacetes que vamos voando para a escolinha!

       O Artur vai na frente pedindo para ver os tratores, guindastes, e bolas de sinalizações aéreas nos fios de energia. Essa cantilena dura todo o percurso, nada é o suficiente para o garotinho:

       _ Tutu tantão trator, Tutu tantão bola,Tutu tantão guindaste. Vovô mais bola, vovô mais trator, vovô mais guindastes.

      De repente escuto o som de um objeto caindo da carruagem. Quando olho para trás, a princesa está jogando fora o que não quer entulhando sua coche. Lá vai o equino alado catar os objetos e ajeitar no porta malas da carruagem. Depois que tudo está longe das mãozinhas ávidas, seguimos o trajeto ao som da princesa “Elsa” cantarolando “Let it go”. 

       Chegando a escola, estaciono a diligência e num passe de mágica volto a ser o vovô Kendinho. Abro os cintos de segurança, liberto as ferinhas, e pego uma parafernália de coisas que levam para escolinha. Um corre para um lado, o outro corre para o outro lado, e os dois sobem nas muretas. Com um pouco de paciência acabam adentrando a escola. Ufa, agora pelo menos estão em um recinto fechado… mas a princesa começa a dar ordens:

       _ Vovô primeiro você deixa o Tutu na sala dele e depois eu.

       Adivinhem se o Cocheiro concorda com isso? 

       _ Primeiro a irmã, primeiro a irmã.

       Depois de muita conversa, choros e um punhado de despedidas, consigo deixar cada um em suas salas. A professora das crianças me fala um punhado de coisas em inglês, eu finjo que entendo e saio de fininho. Não antes de dar um “good morning”.

       A tarde  volto para pegar as crianças na escola, antes que a carruagem vire abóbora. Dessa vez volto prevenido com algumas surpresas nos bolsos, caso tenha que negociar com eles.

Quando chego na sala da Cecília, ela faz de conta que não me vê. Antes não queria entrar na sala e agora não quer ir embora, realmente não dá para compreender. Depois de alguma insistência de minha parte:

       _ Vovô pega o Tutu primeiro, eu preciso acabar o cartão que estou fazendo. Não está vendo que não terminei o cartão de aniversário do papai?

       Para não arrumar rusgas vou ao encontro do netinho. Depois de algumas minutos pego a netinha e vamos direto para a carruagem. Para minha surpresa nenhum dos dois querem ir no bike trailer.

       _ Vovô eu cansei de ser princesa, agora quero ser a cocheira. O Tutu tem que ser o príncipe. Cada dia vou querer ser uma coisa diferente. 

       _ Até unicórnio você vai querer ser?

       _ Vou sim!

       _ Mas você não dá conta de puxar a carruagem.

       _ Aí vovô, você vai ser o cocheiro que puxa a carruagem. 

       Acabo de ser ameaçado de perder minha patente de Unicórnio… isso porque mal tinha experimentado minhas asas. Com muito custo, o cocheiro concordou em virar príncipe em troca de uma das surpresas em meu bolso mágico. Mas não antes de soltar seu chavão:

       _ Tutu quer tantão vovô.

       Rapidamente fecho a negociação com dois  regalos, antes que fique de bolsos vazios. 

       A cocheira vai toda imponente na frente pilotando a carruagem. Ainda bem que nos tempos modernos não se pode mais chicotear os animais. Apenas alguns pedidos de: 

       _ Corre muito, bem rápiso vovô unicórnio!

E o unicórnio que se dane para arrastar todos, o mais rápido que consegue. Depois de algum tempo aterrizamos em casa sãos e salvos. Quando vou descer as crianças, percebo que o agora “Cinderelo”, perdeu um dos sapatos. Podem acreditar, ligamos na escola para saber se ficou por lá, e temos a notícia que ficou caído no elevador. Me parece que nenhuma donzela vai aparecer em nossa porta procurando pelo dono do sapatinho.

       Dia do aniversário do Marlos, pai das crianças, meu genro. Fizemos bolo e todos os preparativos necessários, mas esquecemos de uma coisa que os filhos acham primordial, as velinhas de aniversário.  Minha filha Poliana pede para eu e a Cecilia irmos ao Dollarama comprar. A netinha fica toda animada com a incumbência. Pegamos a bike com os devidos capacetes e partimos para mais uma aventura. 

       _ Vovô temos que comprar uma velinha com o número 3 e outra com o número 5. Não pode esquecer, tá bom vovôôô?

       Depois de muita tagarelice pelo caminho afora, paramos a bike no estacionamento, colocamos o cadeado, e fomos às compras. Quando chegamos na porta de entrada de nosso destino, o Dollarama estava fechado. A decepção ficou estampada no rostinho de minha cocheira preferida.

       _ Vovô onde vamos comprar vela? O bolo não pode ficar sem… Eu quero uma velinha, por favor.

       _ Vamos tentar no supermercado então. Ela abre um sorriso com a nova possibilidade de encontrarmos nossa preciosa encomenda.

      Em pouco tempo estávamos de volta a rua, passamos pela bike e entramos no supermercado. Procuramos por todos os lados as benditas velas e não encontramos. E a menina igual anzol de três fisgas, agarrando por onde passávamos.

       _ Vovô eu quero essas balinhas aqui.

       _ Hoje não filhota, já vai ter muitos docinhos de niver.

       _ E esse chocolates vovô? 

       _ Não minha formiguinha doceira, o bolo já é de chocolate.

       _ Vovô posso pegar um pacote de Cheetos?

       _ O Vovô só trouxe dinheiro para comprar as velinhas, ou vai querer ficar sem as velas? 

       _ Tá bom vovôôô. 

       Procuramos para todo lado e nada de encontrar o principal adereço do bolo.

       _ Cecilia o vovô não fala inglês, você vai ter de perguntar a moça do caixa onde ficam as velinhas.

       _ Não vou perguntar vovô.

       _ Então vamos embora sem as velinhas. 

       A moça do caixa aguarda o desfecho de nossa conversa sem saber do que se tratava. Peço ajuda da netinha mais uma vez e ela arruma uma saída um pouco inusitada:

       _ Eu te ensino vovô, deixe eu falar no seu ouvido: “birthday cake candle”.

       Repito as palavras para a moça do caixa como um papagaio, e ela me responde em inglês é claro. Não consigo entender muito bem, mas a Cecilia resolve trocar umas palavrinhas com ela. A moça percebendo a minha dificuldade, nos acompanha até as velinhas. Não posso deixar de mencionar que havia um punhado de coisas de festa além das velas na tentadora prateleira.

       _ Vovô eu quero levar esses pratinhos, esses copos, os guardanapos …

       Interrompo seus pedidos antes que ela resolva comprar tudo que tem no supermercado:

       _ Só tenho dinheiro para as velinhas e mais uma dessas coisas. O que você vai querer? 

       _ Tá bom vovô, eu quero os pratinhos então. O papai vai ficar muito feliz vovô!

       Mesmo com poucas coisas os olhinhos dela estavam brilhando e doida para voltar para casa. Passamos pelo caixa eletrônico com um pouco de dificuldade e ajuda de um senhor. Minha intérprete, timidamente trocou algumas palavrinhas com ele e eu continuei sem entender nadinha da prosa.

        A netinha sai do supermercado toda saltitante, eu aperto o passo para acompanha-la. Quando chegamos do lado de fora, cadê nossa bike? Tinham conseguido abrir o cadeado e adeus bicicleta!

       _ Viche filhota, roubaram nossa bike, agora temos que voltar a pé…

       _ Vovô não tem problema, ainda bem que não roubaram nossos capacetes. Se a gente tivesse vindo de carro, não teriam roubado né vovô?

       Diga-se de passagem que não tiramos os capacetes da cabeça hora nenhuma, na esperança de sermos mais rápidos. Para meu espanto, ela não deu muita ênfase ao roubo. Voltamos para casa e curtimos o aniversário.

       Agora é ficar de olhos e ouvidos abertos, para não perder nenhuma pérola dessa dupla.  E que dupla viu? Esses meninos de hoje não vem mais com pilhas “Duracel”, já saem de fábrica com bateria de Avião.