Jardins do Âmago... (A Natureza dos Sonhos em Haicais de Ouro)

Orna os ipês

Um véu de mil borboletas;

Afável proeza.

Na orla do infinito

Clarão mel-dourado

Diz adeus ao dia

Brisa da manhã...

Sutil névoa de folhas

A beijar os lagos

Casinha da praia...

Lagartixas na parede...

O capim está alto...

Cogumelos brotam

No tronco do pessegueiro

Coberto de líquen

O Sol se levanta

Por trás dos montes azuis;

Manhã carismática.

Chuva no telhado...

Alguém especial nos braços...

Momento dos sonhos...

Os sapos cantam

Numa nebulosa noite

Atrás do banhado

Forte tempestade...

Os lagos turvos transbordam

No Bosque dos Cedros

Fogueiras de paina...

Geada nos campos ermos...

Nativos se aquecem...

Véu de serração...

Os copos de leite sonham

Com seus colibris

Céu a trovejar...

O Vento passa cantando

Entre as cerejeiras

Nos confins da noite

As campânulas se elevam

Em volta dos córregos

Fim do temporal...

Rumo ao horizonte róseo

Perfeito arco-íris

Raposas encontram

Misteriosos olhos d’água

Em meio aos trigais

Murmúrio dos riachos...

Árvores bailam tranqüilas

Com sutil aragem

Cerca de madeira...

Velho poço no quintal

Da casa sem luz.

Família dormindo...

As lesmas deixam seus rastros

Pelos azulejos.

As libélulas planam

Pelos campos de tulipas

Aos pés da montanha

Adormece a lua...

Vaga-lumes se reúnem

No escuro da mata.

O cipó da abóbora

No buraco do assoalho

Parece uma cobra

Nos lábios do rio

Pétalas de flor de Liz...

Águas perfumadas.

Cheiro de café

Na velha estação do trem

Atrai os viajantes

Embaixo da casa

Senil convenção dos gatos...

Miados eufóricos.

Panela de ferro

No velho fogão à lenha

Vê-se da janela

Perto do penhasco

Sombrios limoeiros derramam

Lágrimas de areia

O verde da mata

Reflete na Mãe-cachoeira

Que desce entre as pedras

Os cupins festejam

Pela casa de madeira

Onde moram gatos

A escada de pedras

Encoberta por raízes

Termina num riacho

No cimo da tarde

A atmosfera suspira

Com o mar parado

Durante a neblina

Morcegos fazem ritual

Atrás dos ciprestes

Pé de flamboyant

No quintal da casa branca;

Vista para os morros.

Mãos sobre o piano...

A alma se funde no Céu

Sob o som da Chuva.

Em campos de sonhos

Olhos atravessam as nuvens

No alvor das imagens

Jardim de Morangos...

Refúgio dos sonhadores...

Lá, se acalma o Tempo...

Cai fina garoa

Sobre as figueiras do lago

Que bem espelha a Lua

Quadros do Dalí

Na parede do celeiro

Dão asas aos pôneis

Os cactos se deitam

Nos carreiros do deserto

Plenos de escorpiões

Sobre as laranjeiras

Do perfumado arvoredo

Os sabiás conversam

As abelhas beijam

Dadivosas pitangueiras

No Vale das Flores

Dócil camundongo

Corre pra baixo do armário;

Mais um na família.

Orquídeas prateadas

Sob intenso vendaval

Brilham com os relâmpagos

No calmo horizonte

A Lua nasce vermelha...

Acordam os anjos...

Coelhos adormecem

Em derredor das pereiras

No alto das colinas

A luz do Sol brônzeo

No tope dos milharais

Ainda projeta-se

Fadinhas melíferas

Beijam violetas purpúreas

Em busca de pólen

Aragem celeste

Arpeja notas nostálgicas

Na harpa dos ventos

Madrugada úmida...

As rãs eufóricas pulam

No viscoso musgo

Escorre luz ígnea

Da face do girassol...

Lágrimas de ouro?

Canto dos pardais...

Água jorrando da bica;

Sinfonia Térrea.

Esquilos descascam,

Na sombra do cinamomo,

Castanhas rasteiras.

Na beira do Mar

O brilho vítreo da areia...

Junto conchinhas.

Peixes coloridos

Formam veloz espiral

Dentro da lagoa

As rosas se abrem

Sob o beijo azul do orvalho;

Despertar sagrado...

No silêncio da mata

Nevoeiros se entrelaçam

Em galhos folhosos

Dentro das colméias

Sublimes favos de mel;

Perfeito Universo.

Lagos e ciprestes

Fascinam lúdicos poetas

Cobertos de grilos

Pode-se ouvir

O sussurro dos arbustos

No final da noite

A velha amoreira

Abriga plúmbeos casulos;

Sonha o Céu alado...

Contra a correnteza

A jornada dos cardumes...

Época de desova.

O secreto oásis

Esconde rúbeos ciprestes;

Tesouro dos poetas.

Meigas pombas brancas...

Imagine uma canção

Onde vence a Paz

Crianças habitam

Pequena casa da árvore;

Doce lar arbóreo.

Muda de araçá

Pai e filho plantam juntos;

Eterna lembrança...

No abrigo da relva

Margaridas fulvas crescem

Aos olhos da gruta...

Por toda a floresta

Incríveis teias de aranha;

Complexos trançados.

Com olhar travesso

O pica-pau faz buracos

Nos velhos pinheiros

Ninho dos canários,

No alto do abacateiro,

Acolhem ovinhos...

Sem medo da neve

Bromélias nascem nos galhos

Da imensa ameixeira

No beiral do chalé

Gigantes balões de vespa

Zelam a segurança...

Caldeirões ao fogo...

Caldo de cana engrossando...

Preparam melado.

Das trilhas da Serra

Ouve-se o som da represa...

Áqüeo véu de noiva...

Planta milagrosa...

Seu direito de existir

O homem caçou.

Áurea imponência

Na imensidão do horizonte...

Amanhece o dia...

Seres luminosos

No mais profundo abissal;

Luz caleidoscópica...

Água cristalina

Nasce numa vala estreita...

Girinos se agrupam

Tarde silenciosa...

Cálidas vitórias-régias

Flutuam no lago

Sente-se a fragrância

E o frescor dos eucaliptos

Na viela de pedras

Aléia dos Cedros...

Caminho dos solitários

Que vagam distantes...

A Rosa das Águas

Medita nas profundezas

De seu lar aquático

Um feixe de luz

No céu da mata cerrada

Coroa um cipreste

Os riachos fogem

Pelo denso pantanal

Com algoz rugido

No pântano atroz

As areias movediças

Mudam de lugar

Lobos a uivar...

O frio vem dum ar distante...

Que mais há lá fora?

Flâmula rosada

Sobrepõe o anel de gazes

Qual contorna a Lua

Lindos beija-flores

Visitam jovem singela

Num velho balanço

Ocultam-se os lagos

Em vapores coloridos...

A terra se abre...

Arranjos de cipós...

Um férreo gosto na água...

Rastros de serpentes...

Seiva do aloé

Goteja sobre o verdume

Das ervas altivas

Flores entreabertas...

Caracóis marrons escalam

Os seus frágeis caules

As pérolas nascem

Sob o amor da concha-mãe...

Por que separá-las?

Imagens se criam

No horizonte da alma...

Ao ápice voam!

Trazem os relâmpagos

A impressão que surge o dia

Em breves instantes

No lago tranqüilo

As estrelas se refletem

Em fiel plenitude

Toca das corujas...

Jovem sábio se aproxima

Com curiosidade

Velho perdigueiro

Escava enormes buracos

Para se esconder

Cães farejadores

Descobrem o esconderijo

Dos ratinhos brancos

O coiote astuto,

Por detrás do galinheiro,

Observa os pintinhos...

Das calimujares,

Nas encostas dos vulcões,

Um mortal perfume.

Flutuam no frio

Das águas que correm límpidas

Os agriões glaciais

Meandros de sombras

Percorrem a estranha parede;

O vento sai da árvore...

Sombras na janela

Parecem bruxas galhosas

Ao sopro do vento

Luzes tenebrosas

Assombram detrás da árvore;

Sombras hilariantes...

A Lua sinistra

Na solidão da janela

Trás vultos dançantes

Pelos campos íngremes

Deslizam os ventos da noite

Que nascem do rio...

Tamanha era a chuva...

Medonhos eram os chorões

Da rua sem fim...

Do jardim dos cravos

A gata de olhos azuis

Chora pras estrelas

Relógio do Sol...

Vive o sonhador do Tempo

Numa eterna tarde

Joaninhas lilases,

Num arranjo de estrelicias,

Vestem o louva-deus...

Santas madressilvas

Olham pras nuvens violáceas

Ao som dos cristais

Deságuam os rios

No coração dos brejais...

As árvores pendem...

Chá de camomila,

Biscoitos no forno à lenha,

Perfumam o lar

Abre-se num campo

Um tapete de papoulas;

Presente da Chuva

Chove de manhã...

Na clareira dos cedrais

Surge uma jibóia!

Num lugar distante

O galo canta baixinho...

Eco na pedreira...

Pedras verde-oceano

Reluzem num lago azul

Cercado de imbuias

O Céu fica escuro...

A canção do vento em flautas

Vem do bambuzal...

Jacarés cascudos

Comportam-se igual a troncos...

Lagoas se fecham...

Pássaros trouxeram

As sementes que hoje são

As flores do xaxim

Mariposas voam

No alto dos pinheirais...

O solo está quente...

Reluzem os crisântemos

Na imensidão verde e flâmea

De um jardim de sonhos

Vertentes de Sol

Passam por entre as paineiras

Alcançando os lírios

Entardecer ruivo...

Poeira do barro vermelho

Sobre as êneas flores...

Densa gota d’água

Faz-se lente sob o Sol;

Galho seco em chamas...

Porquinhos da índia

Devoram capim limão...

Somem de repente...

Chuva de granizo

Em meia-tarde cinzenta;

Congela-se o ar...

2008

Giuliano Fratin, do livro

( Um Pedaço do Universo e Outros Trabalhos, 2010)

Meus caros leitores, se vocês gostaram dos meus haicais, então irão gostar muito mais da evolução deles que é a minha obra "Magnificências" uma das minhas mais recentes postagens, obra onde a magia das cores e da Natureza se manifesta sem fronteiras, regras e outras condições ortodoxas... Saudações e um grande abraço poético...

Giuliano Fratin
Enviado por Giuliano Fratin em 27/09/2011
Reeditado em 09/11/2017
Código do texto: T3243054
Classificação de conteúdo: seguro
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