Miragem
Luziam no horizonte, ainda, os últimos raios púrpuros dos últimos desenganos do meu combalido coração e eu não esperava mais crer na ventura do amor, nem na ilusão dos sentimentos que nos ligam a outrem.
Eclipsavam-se aos poucos naquele horizonte de cor avermelhada os meus últimos sentimentos de amor e também de desilusão neste sentimento que ora me fora tão nobre e, agora, me parecia fictício e irreal. Fruto mesmo da imaginação dos que sonham com o imaginário.
E já começava a crer que a grossa e áspera casca que agora me envolvia o coração, tornando-o imune às sutilezas desse sentimento, jamais se quebrasse.
Um dia, já mais pés na terra, insistindo em trazer à terra, também, o meu coração, que há muito teimava em escolher por morada as estrelas, vi-me de repente sucumbida diante de um olhar. Alguma coisa dentro do coração protegido pela casca áspera e grossa, de cor terra, se agitava num frêmito, sussurrando uma melodia suave e tão sublime, que todo o meu ser se enternecia.
Mas a mente, possuidora de todas as lembranças do passado, das marcas das dores, dos dissabores, habilmente apertara o cerco, procurando amalgamar mais densa e espessa a camada de casca, para proteger o seu tesouro de mais uma desilusão.
E como dois fortes elementos, a mente, como mãe protetora, cuidava ansiosa do seu filho alvissareiro, o coração, já tantas vezes machucado, porém não sei de que força dotado que não se abatera sob tantos dissabores.
E quando naquele céu em que o azul da calma empurrava os últimos vestígios púrpuros da desilusão que ali passara no horizonte uma luz se prenunciara e, de repente, com seus raios fulgurantes a tudo iluminara.
Sob seus raios incandescentes, suaves e brilhantes, mais uma vez sucumbia a mente e nascia o amor, inundando de alegria e sentimento o teimoso e ingênuo coração, derrubando as barreiras, rompendo a casca que o protegera e lançando a semente.
Como uma explosão de estrela, onde das poeiras renascem a vida e novas estrelas, assim o coração vencendo suas próprias barreiras, uma vez ainda se comovera e inundando de luz branca e resplandecente de amor se enternecera.
Aquele riso muitas vezes calmo e ora se fazendo surgir numa suave gargalhada vinda da alma. Um riso profundo, que suas faces iluminavam. O seu olhar negro, profundo, distante e matizado de alguma tristeza infinita, oculta no recôndito da alma, aquele porte nobre e trazendo de volta sonhos do passado, imagens de outrora, como se eu o visse, vestindo as túnicas egípcias, trazendo na cabeça o “claft”, ornado pela “uraeus”, de pé como uma efígie, imóvel e seguro de si, belo, infinitamente belo, aos meus olhos apaixonados, ao meu coração enternecido por suave sentimento de ternura infinita, cheia de carinho e beleza.
Assim, se me apresentara naquela tarde, trazendo em teus olhos o brilho magnífico que tanto amei outrora e que ainda hoje me toca sensivelmente o coração.
Vontade infinita de acariciar suavemente seu rosto, seus olhos, seus lábios, aconchegando-te ao coração, com ternura infinita, não querendo jamais de ti me separar.
E assim mais uma vez, fez-se o amor...