O FrÁgil Requinte dO SilênciO

Qualquer um pode ter um segredo. Fazer-se estar em silêncio. Coibir-se algemando as disformidades da própria verdade com a impudência da mentira alheia. Escoar-se de toda e qualquer inquirição e lançar-se na inquisição de uma liberdade apática e vigiada. Tornar a franqueza uma quimera. A confidência um veto. A confissão uma heresia. Destruir as evidências e não usar aspirinas, porque não existe um antídoto contra a penitência do calar-se inevitável.

O sigilo absoluto é o fardo que carrega o mártir.

Para que a palavra não o confunda.

O olhar nunca o denuncie.

A consciência jamais o traia.

A culpa de modo algum o persiga.

O medo em tempo algum o condene.

Espião de si mesmo, este escravo da omissão será sempre um nômade.

Lacônico, porém de muitos subterfúgios.

Constantemente preocupado em olhar para os lados e falar baixinho.

Indiferente ao humor e alérgico a telefone, cartão de crédito e animal de estimação.

Que prefere enlatados porque vive a suspeitar dos entregadores de pizza.

Que contracena com o seu próprio reflexo no espelho atrás do divã.

E faz amor com mulheres de cabaré.

Armado com cortina, abajur, controle-remoto e uísque, tudo parece perfeito.

Mas as paredes têm ouvidos.

Angello
Enviado por Angello em 13/08/2006
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