PIQUE-ESCONDE

Tudo começou com uma brincadeira de pique-esconde

entre eu, a realidade e o sonho.

Corria certeira para a vida que via

e ao chegar, nada encontrava de vida.

Somente um oco, um vazio, um pragmático.

Estúpido pragmático ateu.

E fechava os olhos para não ver o que via ali.

Escuridão de sentimentos e de verdades, orgulhos cruéis...

Descuidadas atenções sempre tão necessárias.

e no pique-esconde que inventei, eu era criança

e na verdade nada via de certo, pois era pequena, nada sabia.

E corria atrás do orgulho desta coisa

que sequer pode se considerar erudito.

E ao chegar ao que se dizia erudito, nada encontrava,

ou melhor, encontrava o pragmático, lúcido na sua mesquinhez

Consciente de ser sádico, maldito e silencioso.

Ele calava suas verdades, tapando a boca com asneiras,

para deste modo ser mais prático, menos cobiçado,

e ao fazer tal coisa, mal sabia esta coisa

que a si mesmo silenciava e enterrava.

E desistia de si próprio neste saber artístico que tinha para si

dando voltas por cima de um igual morro

para ter a certeza de que não aterrizaria.

Porque este status deste jeito é o bastante, pra que mais?

Tanto afeto, tanta ternura, e tanto dar...

Ficava assim mesmo e quando queria, lá estava o pragmático.

Resoluto de suas pobres idéias, fixado em seus motivos

sempre tão banais e escorregadios, tal qual uma lesma, que mela

o chão ao passar, ele se borra todo de medo...de se dar!Então corria o artístico e romântico, atrás do dito erudito,

E ao chegar, já disse, encontrava o pragmático.

e brincando de pique-esconde, mais fácil era se achar do que se perder

e eu era criança e nada sabia que de tudo já sabia.

E como sabia e por que sabia vi de longe que era mais fácil achar.

Mas que poder tem o artístico, se o dito erudito nada disso era.

Abre a porta da entrada, engole, faz um bolo

e bota porta de saída afora.

Num saco de lixo aberto Dá ainda para respirar!

E como estava aberto, o artístico pode ainda sonhar, por tempos,

através daquela abertura e como disse que eu corro sempre

atrás de sonho,guardei a realidade dentro do saco,

fugi escondida de mim mesma

de mãos dadas com o sonho.

E a pobre coisa ficou sem saber por que o sonho ainda vivia.

É que a coisa de nada entendia, muito nada mesmo do que é sonhar.

É que a coisa era só coisa... E coisa mostrou queria ficar.

Mas o artístico, como todos, vive enrolado nos sonhos

tanto que é impossível que lhe passe pela cabeça a realidade

mostrada com tanta pancada, tanta frieza e claridade

pela coisa que virava a cara e fugia num voar de si mesmo.

Coitado... Sem saber como é bom sonhar e se deixar sonhar!

BSB/1973