Violência Social

Transpor a violência social para o papel, eis um fardo pesado. Mesmo que a vontade seja de tecer comentários de forma superficial não conseguiríamos, pois ela nos puxa para o seu centro como todo tema polêmico prolongando o que deveria ser breve.

Ela é antiga e se espalha de forma rápida e silenciosa e quando menos percebemos, ela nos envolve, tornando muito difícil segurar uma avalanche de vergonhosas atitudes que nos empurra para longe do domínio da situação, seja um desvio de dinheiro ou uma demonstração de preconceito para com o próximo, e estas atitudes nos deixam apenas, como meros espectadores e na maioria das vezes vítimas.

A todos os instantes ela nos incomoda, transformando-se em algo comum, e assim, damos menos importância para as conseqüências. Ela está presente no campo, na forma de sofrimento vivido pelos sem terra que lutam pelo direito de terras improdutivas e debaixo de suas lonas furadas sonham com uma vida melhor; está nos hospitais públicos com suas precariedades, causando medo ao invés de alívio; está nos semblantes de nossos semelhantes que, debaixo das pontes, dividem espaço e comida com os ratos; está sob as palafitas, embalando crianças e velhos, transformando suas noites em longos pesadelos; está nos contracheques dos assalariados que fazem malabarismos com seus cinco pares de cédulas de cinqüenta reais; está na segurança pública, que sem oferecer ideais condições de trabalho, transforma alguns de seus integrantes em cúmplices do crime ou até, em verdadeiros marginais. Nos lugares onde a violência não acha resistência, ela se aloja e cria mais vítimas.

Como a violência social é grande! Olhem à nossa volta e vejam que ela está presente em todos os lugares. São tantos flagrantes que muitas pessoas não conseguem pensar de forma racional, ficando a mercê da situação causada pela violência social. A revolta que está dentro de cada uma destas sofridas pessoas cresce a todo o momento, transformando-as em pessoas amarguradas e inseguras, tornando-as vítimas desta faminta e cruel violência social, aumentando as estatísticas de depressão, suicídios, assassinatos, assaltos, entre outras aberrações. Chamemos assim, aberrações, pois, são conseqüências de uma realidade injusta cada vez mais presente.

Quem seria o culpado? Seriam os políticos e os seus comparsas que manipulam e fazem o que desejam com o dinheiro público? Seria o nosso vizinho que escolheu um homem branco para trabalhar em sua padaria ao invés de um negro? Seriam os nossos ancestrais que ao descobrirem o fogo decidiram dominar a própria raça, dividindo de forma injusta as terras e outros bens, criando assim a desigualdade social? Ou seríamos nós mesmos que, acostumados a apontar e acusar esquecemos que fazemos parte dessa violenta sociedade e que possuímos também, a nossa parcela de culpa? Temos participação desta injusta realidade sim, da escolha dos nossos representantes políticos e até no olhar indiferente para um mendigo.

É uma seqüência incontrolável onde a solução dos problemas é trocada pela indicação de culpados. Não seria esta a forma correta de enfrentar um problema de grande escala. Sabemos que enquanto algumas pessoas comemoram aniversário de cachorro, outras tantas brigam com outros animais por causa de migalhas de pão, enquanto umas viajam para a casa da praia, outras dividem o papelão na calçada. Tudo isso gera revolta nas partes excluídas, resultando na violência física e patrimonial. E assim dizemos: “isso só acontece no Brasil”. Mas devemos lembrar que em outros países não é muito diferente. Eles têm o mesmo problema, alguns menos, outros mais. Talvez seja a nossa angustiante realidade, que nos faça ver um oásis no deserto da injustiça social.

E por fim, quem realmente é o culpado? Devemos dizer que existe um culpado, e este culpado é o homem. Ficamos felizes pela evolução, mas devemos lembrar que foi o homem que inventou as armas, o dinheiro, a política e, mesmo possuindo vasta inteligência, demonstrou ser incapaz de controlar suas ambições, seu desejo pelo poder, a cobiça e a inveja. Um sentimento após o outro que camuflou a violência social, usando as embarcações e carruagens para invadir os continentes. E hoje, temos em nossas vidas reflexos desta violência social, que invade nossas casas pela televisão, pelo rádio, pela internet, pelos nossos parentes e por nós mesmos, fazendo-nos testemunhas desta implacável devastação que ela causa no mundo.

O homem cria guerras para vender armas, inventa doenças para vender remédio, destrói nações, mas, no final de tudo, morre engasgado com o seu próprio ego. E o que fazer diante de tudo isso? Um arregaçar de mangas e o enfrentamento de um problema que muitos fingem não existir já é um bom começo. Somos capazes de corrigir nossos erros, ainda há tempo, precisamos respirar um bom ar, precisamos viver com segurança e não mais chorar por ver um semelhante mendigar o pão. Uma reforma na política do país, a formação de um grupo político sério e com pessoas determinadas a reverter essa imagem do nosso país seria um passo muito importante. Então, como cidadãos brasileiros, usemos nossa forte arma: a consciência. Escolhendo aqueles representantes políticos que apresentem projetos de governo que satisfaçam nossos desejos de mudança e, acompanhemos passo a passo os seus mandatos, exigindo o cumprimento de suas promessas. E na sociedade, devemos nos armar contra a violência social, ajudando os mais necessitados, denunciando crimes e injustiças, estudando as nossas leis para daí exigirmos nossos direitos e cumprir nossos deveres, por que só assim, teremos chance.

Michel Leal
Enviado por Michel Leal em 24/10/2005
Reeditado em 19/02/2016
Código do texto: T62921
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