«Orfeo ed Euridice» * - Frederich Leighton (óleo,1864)
AMOR E PAIXÃO

Deslizam pelo corpo, beijos e mãos,
P´la carne que conhecem a preceito,
O olhar embriagado de paixão
Parece queimar o amor que vai no peito.
 
Paixão é chama, brilha tenuemente,
Aquece o peito, inflama e não satisfaz,
É puro delírio, engana corpo e mente,
Fere a alma como um punhal tenaz.
 
Amor é ar puro, doce aroma matinal,
Fonte cristalina, derrama ternura...
É vida, é alimento tão essencial,
 
Terna emoção, felicidade pura!
Paixão e amor, inefáveis emoções,
Nelas quero mergulhar sem restrições! 


 
Réplica ao lindíssimo soneto «FOGO DA PAIXÃO» do mestre Jacó Filho 

Ana Flor do Lácio






«Orpheu and Euridice» * - George Frederick Watts (óleo, 1904)



* Na mitologia grega, Orfeu era poeta e médico. Filho da musa Calíope e do deus Apolo, que presenteou o filho com uma lira. As sete musas das artes, foram suas mestras, ensinando-o a tocar e a cantar brilhantemente. A ele foi atribuída a invenção da cítara. Quando Orfeu tocava, os pássaros paravam para escutar e as árvores se curvavam para pegar os sons que o vento trazia.

Orfeu se apaixonou pela bela Eurídice e se casaram. Ela era tão bonita que despertou o interesse de outro homem, Aristeu. Depois de recusar Aristeu, este passou a persegui-la. Durante uma fuga, Eurídice tropeçou numa serpente que picou seu pé. Sob o efeito do veneno,  ela acabou por morrer.

O «Pai do Canto», transtornado de tristeza, acompanhado de sua lira foi até o Mundo dos Mortos, para tentar trazê-la de volta. Encontrou muitos monstros durante sua jornada e os encantou com seu canto. Quando Orfeu chegou perto do trono d
o rei do submundo - o deus Hades - este ficou irritado ao ver que um estranho tinha entrado em seus domínios, mas a agonia que sentiu na música de Orfeu comoveu-o. Sua esposa - a deusa Perséfone - implorou-lhe que atendesse o pedido de Orfeu. Assim, Hades atendeu seu desejo. Eurídice poderia voltar com Orfeu ao mundo dos vivos, mas com uma única condição: ele não poderia olhar para Eurídice até que ela, outra vez, estivesse à luz do sol.

Orfeu partiu pela trilha íngreme que levava para fora do escuro reino da morte, tocando músicas de alegria e celebração enquanto caminhava, para guiar a sombra de Eurídice de volta à vida. Ele não olhou nenhuma vez para trás, até atingir a luz do sol. Mas eis que, tomado de intenso amor e esquecido da condição que lhe impuseram, Orfeu resolveu olhar para a sua amada, para se certificar de que ela o estava seguindo. E por um momento, um único momento ele a viu, perto da saída do túnel escuro, perto da vida outra vez. E enquanto ele olhava, Eurídice se tornou de novo um fino fantasma, seu grito final de amor e pena não mais do que um suspiro na brisa que saía do Mundo dos Mortos. Ele a havia perdido para sempre, mas não sem antes ouvir sua trêmula voz:


— Que loucura foi essa que perdeu a mim e a ti, amado Orfeu?
Já de novo os destinos cruéis  me  chamam e o sono começa a
cerrar meus olhos. É hora de dizer-te adeus... A noite imensa
me circunda e ergo em vão para ti as minhas mãos enfraquecidas.
..

Em desespero total, Orfeu se tornou amargo, passando a viver sozinho. (Posteriormente deu origem ao Orfismo, uma espécie de serviço de aconselhamento, ajudando os outros com seus conselhos.) Entregue à lembrança de seu infortúnio, «O Pai do Canto» provocou a ira das mulheres Mênades que tentaram seduzi-lo e se sentiram desprezadas.  Atacaram-no com pedras que caíram inertes aos seus pés. A música de Orfeu amansava até as pedras arremessadas contra ele. Então, furiosas, abafaram sua música com gritos, e o mataram. Jogaram sua cabeça no rio Hebro, e ela flutuou, ainda cantando, "Eurídice! Eurídice!" A cabeça de Orfeu chegou até a ilha de Lesbos, onde os habitantes ergueram um túmulo de onde, dizia-se, era possível ouvir com frequência o maravilhoso som de uma lira.

Chorando, as nove musas reuniram seus pedaços e os enterraram no monte Olimpo. Dizem que desde então, os rouxinóis daquela região começaram a cantar mais docemente que os outros. Orfeu, na morte, se uniu à sua amada Eurídice e a sua lira foi transformada pelos deuses em constelação.

(Adaptação: «O Livro de Ouro da Mitologia»)


 

Os mitos sempre têm algo a nos dizer

Orfeu não resistiu e olhou para trás. Será que se não tivesse se voltado, Eurídice teria conseguido chegar à luz do sol? Essa passagem nos mostra que às vezes estamos no caminho certo mas, lá no fundo, temos uma dúvida, (será que ela está atrás de mim? - Pensou Orfeu), e nos viramos para trás procurando respostas, deitando tudo a perder. Talvez Eurídice não pudesse de qualquer forma voltar à vida, pois o que está feito está consumado e não pode ser revertido.
A superação das coisas irreversíveis e o entendimento profundo delas só a experiência da própria vida poderá nos dar.
Orfeu não resistiu, olhou para trás, querendo ver a sua alma e entendeu que não poderia trazê-la de volta. Depois… depois foi o resto... foi a conscientização, o sofrimento e a espera, para enfim, encontrá-la de novo, noutra dimensão.

 


A arte interpreta o mito

A história de Orfeu e Eurídice é uma ode ao amor eterno. Tem sido fonte de inspiração para poetas, pintores, escultores, músicos, dramaturgos, que, em diferentes períodos históricos, tentaram representar o mais comovente amor da história da mitologia.

*  No Brasil, Vinicius de Morais
escreveu a peça teatral «Orfeu da Conceição».  Transporta à realidade das favelas cariocas e foi premiada em 1954, no concurso de teatro do 4º Centenário de São Paulo, e que serviu de inspiração para o filme «Orfeu», de Cacá Diegues, em 1999.

«Orfeu Negro» é um filme ítalo-franco-brasileiro de 1959, do gênero drama, dirigido por Marcel Camus, adaptado de «Orfeu da Conceição» de V. de Morais.

 * O mito serviu também de inspiração a vários pintores famosos: Eugène Delacroix, George Frederick Watts, Frederich Leighton, Cervelli, entre outros.

*  A bela e funesta história de amor também teve representação na ópera,  inspirando muito especialmente Monteverdi (L' Orfeo), Liszt (Orfeu), Stravinsky (Orfeu) e Christoph Gluck (Orfeo ed Euridice).
A ópera de Gluck «Orfeu e Eurídice» começa com Orfeu lamentando a morte da amada. Uma peça belíssima que vale a pena assistir.


Ana Flor do Lácio


 


«Orfeu lamenta a morte de Eurídice»

Túmulo da família Trevisioli  (Cemitério da Consolação, SP)
Magnífica obra tumular, em granito e bronze, do escultor Nicola Rollo.
As figuras, impressionantes, em tamanho natural, simbolizam o mito
grego. Orfeu lamenta a morte da sua amada, tangendo a sua lira,
tentando trazê-la de volta à vida, tudo isso em vão...


 
Ana Flor do Lácio
Enviado por Ana Flor do Lácio em 10/05/2012
Reeditado em 10/05/2012
Código do texto: T3659766
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