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                                CRIANÇAS NÃO DEVIAM CHORAR

No primeiro olhar que dei logo me emocionei. Foram as lágrimas de uma criança que me deixaram assim, pois acreditava que todas as atitudes destes seres tão jovens eram rigorosamente sinceras, liberto de disfarces ou belas atuações, sem por nem tirar. Em resumo creio mesmo que amam e demonstram sem o menor receio, sem culpa por algum interesse oculto, simplesmente porque era fato.
E quando choravam, por assim eu pensar, um sentimento forte tomava conta de mim. Elas não deveriam chorar! Se foram geradas para trazer alegria deveriam receber sempre da mesma moeda, sem exceções.
Ao vê–lo chorar silenciosamente ali sozinho, parecendo tão desamparado, fiz uma conhecida atitude habitual minha, que consistia em levar alegria na forma de um sorriso, mesmo que fosse para um desconhecido, do qual estranhamente eu me descobri tão próximo.
– Por que você chora? – perguntei ao menino que aparentava uns sete anos e que estava vestido de uma forma nada comum.
O garoto levantou seus redondos olhos pretos que se viam cercados pela face negra.
– São tantos os motivos... – Disse simplesmente.
Analisei sua resposta e prossegui enquanto ele baixava o rosto, procurando o chão.
– Onde estão seus pais?
– Meu pai está no céu! – Respondeu ele rapidamente.
– E sua mãe?
Pareceu–me ver um leve sorriso no rosto do menino antes que ele começasse a falar novamente
– Minha mãe e meu pai estão no céu. – E completou – Ambos são um só!
Comecei a sentir que além de desamparado ele parecia também um pouco perturbado. Ou seria eu?
Em meio aos meus pensamentos nem percebi duas coisas importantes: o garoto não mais chorava, indicando que eu cumprira o meu objetivo inicial e as pessoas que passavam por nós naquela calçada estreita no centro da cidade não nos notavam, como se estivéssemos em outro plano. Se tivesse notado antes este segundo fato provavelmente poderia ter imaginado antes o que estava na verdade acontecendo.
E na minha aparente distração prossegui no diálogo.
– Certo! E você está sozinho aqui, não estou certo?
Ele pareceu pensar e lembrou mesmo um adulto ou até um professor, para ser mais específico.
– Jamais estamos sozinhos. Nem tu nem eu. Tu, pela natureza das coisas e eu, pelo meu trabalho.
Realmente não pude deixar de soltar uma de minhas sinceras e amplamente sonoras gargalhadas.
– E qual seria o seu trabalho meu jovem?
– Para que possas me compreender e evitar que se multipliquem as tuas perguntas, que já são muitas, eu preciso responder antes a primeira questão que me fizeste no início de nossa conversa.
Fiquei surpreso enquanto ele prosseguia.
– Me perguntaste por que eu chorava e lhe respondi que era por muitos motivos. Posso então lhe dizer os principais deles?
Fiz um gesto com a mão para que continuasse.
– Chorava porque tu caminhavas triste, pois eu sou um espelho de tuas emoções. Chorava pela tua sensibilidade em relação ao gigantesco mundo em que vives, onde a injustiça de alguns homens lhe parece às vezes sobrepor à verdadeira justiça do Nosso Pai, Aquele do qual a tua fé nunca deixou que se distanciasse.
– Chorava para lhe chamar a atenção, pois lhe conheço talvez melhor até que tu mesmo e tenho certeza que seria difícil me identificar facilmente devido a minha aparência, não por maldade, mas pelos conceitos que lhe foram ensinados desde pequeno. E este meu choro que realmente lhe tocou foi com o intuito de que conversássemos, pois trago uma mensagem para ti, que vai afastar provavelmente por muito tempo toda a sombra que insiste em querer cobrir o teu coração.
Depois da surpresa inicial fiquei realmente de queixo caído.
– Tu estás certo – prosseguiu ele – crianças não deveriam mesmo chorar e no meu choro tu fizeste o trabalho invertido, o ofício que pertence aos iguais a mim, enquanto procurava uma maneira de melhorar a minha situação, substituindo a minha aparente tristeza pela tua doce alegria. Percebeu alguma vez que uma criança que chora magoada num pequeno momento depois já está distribuindo carinho, sem nenhum rancor, somente o mais puro amor? Pois é, eles nunca estão sozinhos, nós nunca estamos desamparados em qualquer instante de nossa existência. Um mundo melhor está sendo construído dia após dia por pessoas como tu, que jamais deixaram de acreditar que existia realmente esta possibilidade.
– Agora que lhe respondi todas as tuas perguntas vou continuar meu caminho e tenho certeza de que vou te ver por aí...
Ainda fiquei parado ali por um bom tempo, absorvendo ao máximo todo ensinamento daquele encontro e se fosse para esta história ter uma moral escrita no final com certeza essa seria a frase que eu escreveria:
“Para vivermos num mundo melhor basta fazermos a nossa parte e continuar acreditando que Ele existe.”
Seria uma bela frase, continuei repetindo–a baixinho, baixinho. Aos poucos uma lágrima puxou outra e me recordei finalmente de como é tão bom chorar de felicidade.

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Abraços!
JGCosta
Enviado por JGCosta em 28/11/2009
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